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domingo, 26 de agosto de 2018

Dois anos depois, Chacina da Grande Messejana está longe do desfecho

Expectativa de fontes ligadas ao processo que apura a responsabilidade sobre as mortes de 11 pessoas, em novembro de 2015, é que o caso leve anos para ter um desfecho,

Familiares das vitimas aguardam desfecho judicial dos crimes da madrugada de 12 de novembro de 2015 TATIANA FORTES

Familiares das vitimas aguardam desfecho judicial dos crimes da madrugada de 12 de novembro de 2015 TATIANA FORTES
Desencadeada por uma sequência de revanchismos e acertos de contas originados numa discussão banal, a maior chacina da história de Fortaleza completará dois anos no próximo domingo, 12. Quando o relógio marcar 0h25min, terão se passado 731 dias do momento em que as quatro primeiras vítimas foram sumariamente executadas, na rua Lucimar de Oliveira, no Curió, bairro cujo nome foi atrelado de maneira inesquecível a uma tragédia sem precedentes locais.
Conforme os autos do processo, em 12 de novembro de 2015, numa ação contínua, que durou aproximadamente 3h30min, um grupo de policiais militares assassinou outras sete pessoas, feriu gravemente mais três e praticou três torturas físicas e uma tortura psicológica. Uma verdadeira barbárie que repercutiu internacionalmente e ficou conhecida como Chacina da Grande Messejana ou Chacina do Curió.
Entre o momento em que o primeiro tiro foi disparado e o acatamento da denúncia que levou 44 PMs à prisão, se passaram nove meses e 15 dias. Neste intervalo, considerado razoavelmente rápido, havia uma pressão da sociedade civil e do próprio Governo do Estado para que os autores dos crimes fossem levados à Justiça. Mas, apesar do tempo desde o episódio, a expectativa é de que, judicialmente, o caso ainda se arraste por anos.
Depois do acatamento da denúncia, veio o encarceramento preventivo dos militares, no que se configurou como a maior prisão em massa de PMs ocorrida no Ceará, durando oito meses e 24 dias. Nesse período, o trâmite processual se manteve célere, em razão dos prejuízos que poderiam ser causados àqueles que, futuramente, por ventura, fossem considerados inocentes.
Com a revogação das prisões, os mais prejudicados com a demora nos julgamentos serão os familiares das vítimas, que ainda aguardam um desfecho. “Enquanto eles estavam presos, nós mantínhamos a esperança de que essa situação tivesse um final em breve. Com a soltura, isso deve se arrastar por muitos anos”, confidenciou ao O POVO uma das fontes ligadas ao caso, que pediu para não ser identificada.
Até a última terça-feira, 7, o processo, que tramita na 1ª Vara do Júri do Fórum Clóvis Beviláqua, desmembrado em três ações, acumulava quase 28 mil páginas e aguardava a manifestação do Ministério Público do Ceará (MPCE), que se posicionaria sobre os recursos impetrados pelos 34 réus que foram pronunciados pelos magistrados que atuam no caso. Pela decisão, eles serão levados a júri popular. Todos, porém, recorreram. O MPCE informou, contudo, que entregaria os documentos ainda nesta semana.
Por sua vez, o Ministério Público também apresentou recursos especiais, solicitando que os outros dez réus, impronunciados pelos juízes, fossem novamente incluídos e levados a júri. A manifestação das defesas também estaria sendo aguardada. Além disso, a possibilidade, em tese, de que embargos sejam impetrados junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) afasta, ainda mais, a possibilidade de um desfecho próximo.

DA CHACINA À JUSTIÇA
ENTENDA O PASSO A PASSO DO PROCESSO
 
50
POLICIAIS, pelo menos, foram investigados pela CGD, conforme O POVO apurou. Estima-se que o número de agentes que sabiam da matança seja bem maior.

38
FORAM INDICIADOS pela CGD por participação direta nos crimes.

45
FORAM DENUNCIADOS à Justiça pelo Ministério Público, que considerou haver indícios suficientes contra os policiais.

44
DENÚNCIAS foram acatadas pelos juízes. Todos foram presos preventivamente.

34
POLICIAIS irão a júri popular. Dez tiveram processos arquivados. Todos tiveram prisões revogadas, menos um, envolvido em fatos que teriam desencadeado a chacina. As defesas dos 34 réus recorreram. O MP recorreu contra os dez arquivamentos.

INSTÂNCIA
Juízes avaliarão se mantêm a pronúncia dos 34 réus. Caso mantenham, recursos seguem para o Tribunal de Justiça.
CRONOLOGIA 25.10.2015
21h20min. No Curió, Raimundo Cleiton Pereira da Silva discute com Irisleide Costa de Andrade, irmã do PM Marcilio Costa de Andrade, 31. O motivo: ela teria dito que Cleiton estava sendo traído pela namorada. Marcílio agride Cleiton, que aciona a Polícia.
 
21h30min
Cleiton é abordado por Pedro Anderson Alves Domingo e Francisco de Assis Moura de Oliveira Filho, 16, o Nenem. Segundo o inquérito, ambos traficavam drogas. Eles teriam ameaçado Cleiton por ele ter chamado a PM, algo que havia sido proibido por eles na região. A dupla ordena que Cleiton os siga. Investigações apontam que a dupla pretendia executá-lo.

22h20min
Os três são surpreendidos por Marcílio, acompanhado do cunhado, Giovanni Soares dos Santos, 22. Eles chegam atirando. Um dos disparos mata Nenem. Cleiton corre, é atingido, mas sobrevive. Segundo os autos, Marcílio é ameaçado por familiares de Nenem. Giovanni foge. Marcílio deixa o Curió com a família, com escolta de PMs. Para os promotores, Marcílio induziu colegas a encararem o problema pessoal como institucional.
30.10
Pai de Neném, o cadeirante Francisco de Assis de Moura de Oliveira é executado. A CGD considera Marcílio e Giovanni suspeitos também deste crime. Perícia apontaria que o cano da arma que matou o pai de Neném é o mesmo usado na chacina.

11.11
21h30min
O PM Valterberg Chaves Serpa é morto em tentativa de assalto, na Lagoa Redonda. É o estopim do acerto de contas. Policiais convocam colegas para procurar suspeitos de matar Serpa e vingar a expulsão de Marcílio. De pontos de diferentes, PMs (alguns de folga) vão ao Curió.

12.11
23h30min
Jovem que fugiu de casa de reabilitação de dependentes químicos é baleado, no São Miguel. Internado por 18 dias, ele sobrevive.

0h25min
Tem início a matança. No Curió, são executados: Antônio Alisson Inácio Cardoso, 17; Jardel Lima dos Santos, 17; e Álef Souza Cavalcante, 17. Pedro Alcântara Barroso do Nascimento Filho, 18, é baleado e morre no hospital. Outro jovem é baleado, mas sobrevive. Homem que socorria as vítimas foi atingido por oito disparos. Sobrevive após coma de 22 dias.
 
1 hora
No Alagadiço Novo, encapuzados matam Marcelo da Silva Mendes, 17, e Patrício João Pinho Leite, 16.

1h05min
Na Lagoa Redonda, Renayson Girão da Silva, 17, e outros passageiros são retirados de ônibus. Ele é executado.
 
1h45min
No São Miguel, são assassinados: Jandson Alexandre de Sousa, 19, Francisco Elenildo Pereira Chagas, 41, e Valmir Ferreira da Conceição, 37. No Barroso, José Gilvan Pinto Barbosa, 41, é morto.
AS VÍTIMAS E OS RÉUS
OS ONZE:
Antônio Alisson Inácio Cardoso, 17; Jardel Lima dos Santos, 17; Álef Souza Cavalcante, 17; Pedro Alcântara Barroso do Nascimento Filho, 18; Francisco Elenildo Pereira Chagas, 41; Marcelo da Silva Mendes, 17; Patrício João Pinho Leite, 16; Renayson Girão da Silva, 17; Jandson Alexandre de Sousa, 19; Valmir Ferreira da Conceição, 37; e José Gilvan Pinto Barbosa, 41.
No primeiro momento, Gilvan foi erroneamente identificado como Marcelo da Silva Pereira.
 
As vítimas, que não possuíam antecedentes criminais por delitos graves, foram executadas nos bairros Curió, Lagoa Redonda, Alagadiço Novo e Barroso, todos na Grande Messejana.
 
OS RÉUS:
Os processos foram desmembrados em três ações, dividas entre supostos núcleos de atuação dos policiais: 
1º processo (8 PMs)
NÚCLEO DA TORTURA
Refere-se aos PMs que teriam presenciado ou praticado torturas.

2º processo (18 PMs)

NÚCLEO DOS FARDADOS
Refere-se aos PMs que estavam em serviço em viaturas caracterizadas.
 
3º processo (8 PMs) NÚCLEO DOS À PAISANA
Refere-se aos PMs de folga no dia da chacina. Do grupo, outros dez foram impronunciados e tiveram os processos arquivados 
THIAGO PAIVA | IGOR CAVALCANTE

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