De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em um ano o número passou de 337 para 1.060
19/11/2019 - 16h52 - Atualizada em: 20/11/2019 - 08h04
Por Ângela Prestes
angela.prestes@somosnsc.com.br
Santa Catarina tem a maior taxa de registros de injúria racial do Brasil. Foram 15 casos denunciados a cada 100 mil habitantes no ano de 2018. Em relação aos números absolutos, o Estado fica em 4º lugar no ranking, com 1.060 registros. Um aumento de 211% em relação ao ano de 2017 que teve 337 denúncias. Considerando a taxa o Estado catarinense é o primeiro, seguido pelo Rio Grande do Sul (13,3) e Mato Grosso (12,3). Já em números absolutos quem ocupa o primeiro lugar é o Rio Grande do Sul (1.507), seguido pelo Paraná (1.239) e Rio de Janeiro (1.073). Os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Para a gerente de Políticas para Igualdade Racial e Imigrantes do Estado de Santa Catarina, Regina Célia da Silva Suenes, apesar de importantes avanços em diversos setores do desenvolvimento, ainda persistem as desigualdades raciais, étnicas e de gênero.
— Santa Catarina é um Estado eminentemente branco, que perpetua os resquícios históricos de exclusão e discriminação racial. Os dados mostram que o Estado ainda está muito aquém de uma realidade ideal em termos de igualdade, principalmente em relação à diferença salarial, de funções de liderança que não são exercidas pelo negro, o pouco acesso a educação de ensino superior, ao alto índice de suicídio entre jovens negros, entre outros.
Região Sul no topo do ranking
Em todo o Brasil, a variação foi menor. O número passou de 6.195 em 2017 para 7.616 no ano passado, um aumento de 20%. As regiões Sul e Sudeste estão no topo da lista dos Estados brasileiros com mais registros de casos de injúria. Para a coordenadora do Movimento Negro Unificado (MNU) e professora da educação quilombola, Maria de Lourdes Mina, os dados têm relação com a imigração europeia.
— Está relacionado com a formação dos Estados. Santa Catarina é um dos mais racistas, e tem uma concepção eurocêntrica. Pra mudar isso é preciso ter uma política séria de reparações. Reparações por todo o sofrimento, todos os assassinatos da população negra. Se você se debruça na história de como foi a perversidade no período da escravidão vai entender que o Estado deve essa política de reparações.
É o acesso a educação de qualidade, a moradia adequada, entre outros, que mudará esse cenário. Segundo Regina, hoje, apesar dos significativos avanços em relação à promoção de direitos a população negra, ainda se trata de uma minoria que tem acesso a eles.
— A ideia de inferioridade do negro é fundamentada por esta constituição escravista por um lado, da manutenção de uma condição social de subalternidade do outro, elementos que levam a sociedade brasileira a reproduzir práticas racistas e desiguais que só serão superadas com um processo de profunda transformação social. Portanto, enquanto Estado se pode contribuir para este desafio com ações que possibilitem diagnóstico, planejamento, articulação, que são fundamentais para a construção de políticas públicas para a população negra.
Liberdade para denunciar
O aumento no número de registros pode, de certa forma, representar um sentimento maior de liberdade para fazer a denúncia. Esse avanço é fruto de trabalhos como o do Movimento Negro Unificado, que atua há 26 anos em Santa Catarina.
— É resultado da identificação da população negra enquanto negros. Hoje temos um debate muito mais aberto e muito mais intenso. Não podemos negar que o debate está mais próximo das pessoas que se fortalecem para fazer as denúncias, explica Maria de Lourdes.
Para Regina, é fundamental denunciar para resguardar a cidadania e a dignidade da população negra, além de serem ferramentas que engrossarão os números que comporão o diagnóstico para a construção de Políticas Públicas no Estado.
— A falta de Políticas Públicas efetivas em relação à população negra incorre em uma abertura para fortalecer a invisibilidade e o racismo estrutural existente. Na verdade o racismo sempre esteve presente, o número de registros só desvenda uma demanda reprimida e o mito da democracia racial.
O importante é continuar discutindo o assunto e trazer para a frente do debate a realidade da população negra.
— A discussão do tema é uma tarefa que não é só do movimento negro, mas de toda a sociedade. As vidas negras importam, são elas que estão aí na base da sociedade, que construíram e continuam construindo esses Estados, conclui Maria de Lourdes.
Diferença entre racismo e injúria racial
A injúria racial acontece quando alguém usa a origem, etnia, raça ou religião para ofender a honra de outra pessoa. Ela está prevista no artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal: "Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência". A pena é de um a três anos de prisão.
Já o crime de racismo, inafiançável e imprescritível, se caracteriza por uma discriminação generalizada a um grupo de pessoas. A Lei do Racismo foi sancionada em 5 de janeiro de 1989 e a pena varia entre 1 a 5 anos de prisão, de acordo com o caso.
Gustavo Motta
André Soares
Rodrigo Blockl
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