Só o fim dos autos de resistência pode acabar com os esquadrões da morte
por Paulo Teixeira*, especial para o Viomundo
Existe hoje um verdadeiro Esquadrão da Morte na Polícia Militar do Rio de Janeiro. É o que mostra a reportagem A tropa dos confrontos, de Fábio Teixeira e Igor Mello, publicada por O Globo em 26 de novembro: apenas 20 PMs se envolveram em 356 mortes em confronto entre 2010 e 2015, mais de 10% das mortes provocadas por toda a tropa ao longo dos seis anos.
As ações desses agentes remetem àquelas dos policias que atuavam como um poder extra-legal durante a ditadura militar na cidade de São Paulo, cometendo o que o jurista e promotor de justiça Helio Bicudo, que resolveu investigá-las, qualificou como as “mais graves formas de violência contra a pessoa humana”.
Batizado de Esquadrão da Morte, o grupo era comandado pelo delegado do Departamento de Ordem e Política Social (Dops) Sérgio Paranhos Fleury, conhecido como “caçador de bandidos”.
Policiais assassinos como os identificados pela reportagem de O Globo, os maus policiais, não podem ficar impunes e seguir na instituição.
Esses não são os policiais que morrem em confronto protegendo a população, são matadores que estimulam a guerra. A matéria mostra que dos 20 PMs envolvidos nas 356 mortes, 11 são ou foram alvos de inquéritos por outros crimes como corrupção, tráfico de drogas e peculato.
O alto número de mortes em ações policiais é um problema grave em todo o país, não só no Rio de Janeiro. Quase 22 mil pessoas foram mortas em ações policias no Brasil entre 2009 e 2016. Só no ano passado foram 4.224 mortes em decorrência de intervenção policial, um aumento de 25,8% em relação ao ano anterior. Os dados são do 11° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
Uma das maneiras de enfrentar esse cenário trágico, que afeta principalmente a população jovem, negra e periférica, é acabar com os chamados “autos de resistência”.
Herança da ditadura militar, o termo serve para se referir às mortes causadas por policiais quando alega-se que houve reação da vítima.
Contudo, muitas vezes esse instrumento acaba servindo na prática como uma licença para matar, já que as mortes assim classificadas não são devidamente investigadas.
Análises apontam que muitos desses inquéritos apresentam graves deficiências, como falta de oitiva de todos os envolvidos na ação, falha na busca por testemunhas desvinculadas de corporações policiais e ausência de perícias básicas como a análise da cena do crime, que é frequentemente alterada.
Está em pauta para ser votado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4471/12, de minha autoria, que propõe acabar com a prática dos autos de resistência e obriga que todas as mortes decorrentes de intervenção policial sejam investigadas. É uma forma de acabar com essas execuções disfarçadas de ação de segurança pública.
É preciso garantir que haja instauração imediata de inquérito quando uma ação resultar em morte.
As falhas ou a inexistência de investigação, além do fraco envolvimento do Ministério Público e do Judiciário nesses casos, contribuem para que alguns agentes do Estado pratiquem o que, em última instância, é a execução da pena de morte no Brasil.
* Paulo Teixeira é deputado federal (PT-SP), bacharel e mestre em Direito pela USP.
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