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quinta-feira, 29 de março de 2018

Alexandre de Moraes no Supremo é o retrato de uma república avacalhada

Opinião

por Maurício Moraes — publicado 07/02/2017 14h53, última modificação 13/03/2017 17h46

No Brasil real, do pós-2016, as velhas práticas espúrias se impõem sem qualquer constrangimento sobre qualquer teoria republicana
Alexandre de Moraes chegou lá. E lá ficará até 2043. A nomeação do atual ministro da Justiça para integrar a Suprema Corte no lugar de Teori Zavascki, cuja morte ainda nem foi plenamente digerida pelo País, é o mais recente capítulo da grande avacalhação a que a República tem sido exposta desde a destituição de Dilma Rousseff da presidência. 
Se analisarmos a nomeação de Moraes com régua da institucionalidade, aquela da República democrática e da decência política, ele sequer poderia virar ministro. O próprio Alexandre Moraes defendeu isso em sua tese de doutorado na USP. “É vedado (para o cargo de ministro do STF) o acesso daqueles que estiverem no exercício ou tiveram exercido cargo de confiança no Poder Executivo”, disse quem até ontem era ministro de Temer. 
Moraes pode se esquivar dizendo algo do tipo: “Esqueçam o que eu escrevi. O que vale é o daqui para adiante”. Só que aí mora o problema. 
O tucano vai ser o juiz revisor do processo da Lava Jato. Como pode um ministro que é um dos mais próximos de Temer, filiado ao PSDB, ter isenção para julgar o processo em que seu antigo chefe é citado em dezenas de delações, assim como todo o núcleo duro do governo? 
Como Moraes terá isenção para julgar “Angorá”, apelido de Moreira Franco na lista da Odebrecht, o mesmo que Temer promoveu a ministro na última semana para protegê-lo com o foro privilegiado do STF? Por sinal, movimentação idêntica a de Dilma ao nomear Lula como ministro, com a diferença que desta vez não se escutou nenhuma panela nem qualquer áudio ilegal foi vazado em rede nacional. 
Como Moraes será independente ao julgar o “Santo”, vulgo Geraldo Alckmin, seu padrinho político, a quem ele tão bem serviu como Secretário de Segurança Pública, reprimindo com violência até protesto de estudante secundarista? Moraes na ocasião entrou com a Polícia Militar nas escolas sem mandado judicial, rasgando a Constituição da qual ele será em tese um guardião no STF. Isso sem falar que o número de mortes por policiais disparou quando ele esteve à frente da secretaria. 
Vai ainda julgar o ministro da Casa Civil, Eliseu “Primo” Padilha, o ex-presidente do Senado, Renan “Justiça” Calheiros, o recém-eleito para o cargo, Eunício “Índio” de Oliveira, e, claro, Eduardo “Caranguejo” Cunha, de quem já foi advogado. Além dos amigos do PMDB, Moraes vai julgar ainda o aliado do DEM e presidente da Câmara, Rodrigo “Botafogo” Maia. Como acreditar em isenção? 
Moraes e Alckmin
Como Moraes será independente ao julgar o “Santo”, vulgo Alckmin, seu padrinho? (Edson Lopes Jr./Governo de SP)
Vamos lembrar ainda que a costura do nome de Moraes foi feita por Gilmar Mendes, o ministro que nem faz questão de disfarçar sua parcialidade toda vez que o STF julga interesses dos grandes grupos econômicos do país. O mesmo ministro que, apesar de neste momento julgar a validação da chapa eleitoral de Michel Temer, viaja com ele para Portugal num dia, no outro dia jantam os dois com Moreira Franco “Angorá”. E a desfaçatez ganha até registro na Globo, no fim do Fantástico, como se fosse normal juiz jantar com réu. 

Aos paneleiros cumpre comunicar que a Lava Jato está sendo sufocada, está para morrer. Que vocês foram feitos de palhaço. É o “grande acordo nacional” que o Romero “Caju” Jucáfalava naquele áudio vazado antes do impeachment, que ele dizia ser preciso tirar logo Dilma de cena e “botar o Michel”. Que o problema era “Teori Zavascki”. Mas tudo se resolveria com um grande “acordo”, “com o Supremo, com tudo”. Coincidências? 
E vamos lembrar ainda que Moraes já defendeu o uso da tortura em sala de aula e recentemente virou motivo de piada ao gravar um vídeo cortando pés de maconha no Paraguai. Ao apresentar um criticado Plano Nacional de Segurança, disse querer extinguir a maconha da América do Sul. Nem o Capitão América conseguiria tal façanha! 
Até setores conservadores ficaram estarrecidos com a nomeação de Moraes. Como pode um ministro que se mostrou tão incompetente em meio à crise nos presídios, detonada pelo fortalecimento do PCC em todo o país, virar agora ministro do STF? 
Sobre isso, aliás, pesam suspeitas ainda mais estarrecedoras sobre Moraes, que anos atrás foi o advogado de uma empresa “lavanderia” do PCC. Até aí, é legítimo que todos tenham direito à defesa, inclusive o PCC, e advogados criminalistas não devem ser depreciados por isso. 
O resumo da ópera bufa é que a avacalhação é a norma na era Temer. Aquela história de República, instituição, democracia parece ter virado apenas conceito teórico que se aprende em livro de juristas como Alexandre Moraes. Apesar de parecer um desastre, a nomeação de Temer para o STF faz todo o sentido para o atual grupo de gangsters que tomou o comando do País e que agora tem fôlego garantido até 2018 (esqueçam a história de cassação de chapa e eleições indiretas).
No Brasil real, do pós-2016, as velhas práticas espúrias se impõem sem qualquer constrangimento sobre qualquer teoria republicana. Talvez sempre tenha sido assim e andávamos iludidos. A única diferença é que antes eles eram mais discretos e nos faziam crer em alguma institucionalidade. Agora, a desfaçatez é total. A avacalhação é generalizada.

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