Subtenente Gonzaga (PDT-MG)

Ação Penal 944 - crimes contra o sistema financeiro nacional

“A acusação recai sobre uma cooperativa da qual fui diretor. Em 1999, a Cooperativa de Crédito dos Servidores Militares, Polícia Civil e da Secretaria da Educação do Estado de Minas Gerais (Coopemg) foi criada. 
Dois anos depois fizemos alguns investimentos, como a implantação de uma farmácia, um plano de previdência complementar, além da participação em uma corretora de seguros. Já em 2003, o Banco Central (BC) nos alertou que uma cooperativa não poderia ter outras empresas, então as fechamos. 
No ano seguinte, nos desfazemos de todos os empreendimentos, o que nos causou um grande prejuízo. Em março de 2005 deixei a direção administrativa da cooperativa. Então, o BC reprovou as contas da Coopemg, alegando fraude contábil nas escrituras. Nenhuma parte do processo aponta que nos beneficiamos do caso. 
Não há comprovação de benefício financeiro próprio. Não obtive nenhuma vantagem com isso. A cooperativa existe até hoje. A denúncia de gestão fraudulenta não me traduz”, disse o deputado”.

Do Crimes de gestão temerária cometido contra cooperados e a Coopemg

"A gestão temerária, segundo Rodolfo Tigre Maia, parte de um conceito “normativocultural”, presente em outras disposições penais, como, por exemplo, o art. 219 do Có- digo Penal (“Raptar mulher honesta...”) (1996, pp. 59/60). Encerra-se no tipo, pois, o que se pode chamar conceito subjetivo, que muito aproveita dos costumes e do senso comum da sociedade. 
Apesar da certa dose de subjetividade, o tipo previsto no parágrafo único do art. 4º da Lei nº 7.492/86 não fere o princípio da legalidade, conforme já decidiu a 2ª Turma do Eg. TRF 5ª Região, quando do julgamento do HC nº 500.038-CE (Rel. Juiz José Delgado, DOE 3-2-90). Comentando o dispositivo análogo contido na Lei dos Crimes contra a Economia Popular (art. 3º, inc. IX), assenta Paschoal Mantecca que “a gestão temerária traduz-se pela impetuosidade com que são conduzidos os negócios, o que aumenta o risco de que as atividades empresariais terminem por causar prejuízos a terceiros, ou por malversar o dinheiro empregado na sociedade infratora” (1985, p. 41). 
A princípio, consigne-se que o risco é algo absolutamente normal, e até necessá- rio dentro de uma gestão ativa de Instituição Financeira. 

O jogo de mercado e a natureza dos produtos exige desenvoltura e perspicácia, como numa aposta em que se pode, legitimamente, ganhar ou perder. 

O que deve ser observado, todavia, é que as Instituições Financeiras, em sua maioria, não trabalham com dinheiro próprio, mas com o dinheiro dos correntistas e investidores, entregues em fidúcia. Daí a pertinência e a justificação do tipo penal em tela. 
A Instituição Financeira, uma intermediária, necessita estar submetida a certos limites de atuação na gestão do patrimônio alheio. 

O risco, assim, é válido e plenamente aceitável enquanto subscrito à normalidade de um investimento ou de um produto mercadológico, devendo-se considerar a exigência do nível de cautela não sob a ótica do homem comum (hominus medius), e sim sob a ótica do próprio mercado financeiro. 
Essa a razão das Resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) e Circulares do Banco Central do Brasil que estabelecem princípios e limites ao empenho de pecúnia, como a seletividade de investimentos, a diversificação dos riscos, a multiplicidade de clientes e a obrigatoriedade de respeito a garantias e requisitos básicos nas operações de abertura de crédito pré-aprovado e nos financiamentos. 

Referidos postulados zelam por um fator de cautela imposto após estudos abstratos acerca do ní- vel mínimo de segurança, necessário, em tese, à perenidade e à credibilidade das Instituições Financeiras nacionais e, conseqüentemente, de todo o Sistema Financeiro Nacional. 
Isso significa que não se pode punir por gestão temerária, por exemplo, os administradores de um banco que sofrera perdas irreversíveis por causa de um investimento de alto risco, desde que a intenção fosse apenas angariar lucros na operação, e não tripudiar com o dinheiro alheio. 

A situação se inverte, todavia, caso fique comprovada a inobservância aos requisitos básicos suprareferidos, hipótese na qual se aceitara, implícita e temerariamente, que o fracasso da empreitada levasse à dangerosa situação de insolvência. 
Finalmente, o crime de gestão temerária também é de mera conduta, podendo ou não vir a se concretizar o efetivo prejuízo, bastando, para o enquadramento penal, a efetiva manutenção da Instituição Financeira em “corda circense”, o que sobremaneira repugna à relevantíssima solidez sistêmica. 
Importante destacar que, na gestão temerária, o agente não tenciona ocultar ou alcançar tangencialmente um negócio ilícito – apenas atua com notável exagero e inaceitável impetuosidade em situações que seriam inicialmente corriqueiras (aplicações, abatimento de dívidas, resgate de investimentos, etc.). 
Como exemplos práticos comuns de gestão temerária, tem-se a realização de empréstimos sem as garantias de praxe do mercado, o perdão extremoso e inusitado de encargos de empréstimos, o financiamento de campanha política com recursos da Instituição Financeira e, até mesmo, o trato contumaz com empresas sem qualquer confiança no mercado, o que reafirma a diferenciação básica entre a gestão fraudulenta e a gestão temerária: naquela se pratica atos ardilosos e bem orquestrados para a efetivação oculta de negócio naturalmente ilegal, enquanto nesta se submete a riscos excessivos e irresponsáveis o patrimônio dos correntistas e investidores, que outrora confiaram nos freios de ousadia da Instituição Financeira.
A questão da reprovabilidade da gestão virulenta em Instituições Financeiras é sustentada na contrariedade direta às proibições ou limitações fixadas em Leis, Resoluções do Conselho Monetário Nacional e Circulares do Banco Central, especialmente em face da credibilidade de que o mercado financeiro necessita para cumprir o seu papel no incremento e aprimoramento da sociedade de produção e consumo, o que, em última análise, é essencial para a concretização do sonho de desenvolvimento industrial e tecnológico de um país."


O referido dispositivo da citada lei tem o seguinte conteúdo:

Art. 4º Gerir fraudulentamente instituição financeira: 
Pena – Reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos, e multa.

Parágrafo único. Se a gestão é temerária:
Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoDetalhe.asp?incidente=4789585

Autor: Leonardo Henrique Mundim Moraes Oliveira