14 de março de 2019: O PM Ronnie Lessa (à frente), acusado de matar Marielle Franco, é escoltado após deixar a Delegacia de Homicídios do Rio
Imagem: Marcelo Theobald/Agência O GloboRESUMO DA NOTÍCIA
- MP-RJ aponta Ronnie Lessa, acusado de matar Marielle, como chefe de milícia
- Documento diz que o PM teve bingo e queria vender água em áreas do tráfico
- Defesa de Lessa tenta transferi-lo de presídio federal para uma cadeia no Rio
O sargento da reserva da Polícia Militar Ronnie Lessa, acusado de matar a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes, é chefe de milícia na zona oeste carioca, foi dono de um bingo clandestino na Barra da Tijuca e planejava, antes de ser preso, expandir seu negócio de distribuição de água para áreas dominadas por traficantes de drogas do Rio.
As informações constam em relatório da Coordenadoria de Segurança e Inteligência do MP-RJ (Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro), que serviu de base para o pedido aceito pela Justiça do Rio para transferir Lessa para o sistema penitenciário federal.
Lessa foi preso em 12 de março, junto com o ex-PM Élcio Vieira de Queiroz, que foi acusado de dirigir o carro usado no atentado.
Na casa de um amigo do sargento aposentado, policiais civis efetuaram a maior apreensão de fuzis da história do Rio de Janeiro. A suspeita é a de que ele também atue no ramo de tráfico de armas.
Duas semanas depois de serem detidos, Lessa e Élcio foram transferidos para o presídio federal de Mossoró (RN). A dupla foi novamente transferida em julho, desta vez para o presídio federal de Porto Velho.
A defesa do PM pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que ele retorne a um presídio do Rio. Lessa nega que tenha matado Marielle e Anderson. A ministra Rosa Weber negou o pedido de liminar, mas ainda julgará o mérito do caso.
Chefe de milícia
Órgãos do sistema de inteligência policial do Rio apontam Lessa como um dos chefes do grupo paramilitar atuante nas comunidades de Rio das Pedras e da Gardênia Azul, ambas na zona oeste da capital.
"O grupo liderado por Ronnie teria vínculo com contraventores que exploram máquinas caça-níquel, além de outras organizações, a exemplo de milícias e grupos de extermínio", lê-se no relatório do MP-RJ.
No documento são citados pelo menos quatro policiais militares da ativa que integrariam o grupo do acusado de assassinar Marielle.
"A organização criminosa da qual Ronnie Lessa faz parte é composta por indivíduos que praticam há anos diversos delitos [...], incluindo crimes dolosos contra a vida."
Rio das Pedras é uma comunidade dominada pela milícia cujo braço armado é conhecido como Escritório do Crime: um grupo de assassinos de aluguel que tem como clientes principais a máfia do jogo do bicho.
Bingo na Barra da Tijuca
Na noite de 25 de julho do ano passado, quatro meses após a morte de Marielle, policiais militares do 31º Batalhão do Rio receberam uma denúncia de que um restaurante na Barra da Tijuca serviria de fachada para um bingo clandestino.
Ao chegar o local, os PMs encontraram mais de 80 máquinas caça-níquel. Três funcionários e sete clientes foram levados à 16ª DP.
"Segundo fontes humanas, Ronnie era um dos proprietários do estabelecimento ilegal", lê-se no relatório do setor do inteligência do Ministério Público do Rio de Janeiro.
O UOL apurou que Ronnie Lessa chegou a reclamar da apreensão das máquinas com policiais da 16º DP.
Venda de água
Ronnie Lessa, segundo as investigações, também tem negócios de distribuição de galões de água, um dos ramos prediletos de atuação de milicianos. O sócio dele nesta empreitada seria um outro policial militar da ativa.
"Um dos negócios mantidos seria a venda de água, comércio aparentemente legal que demonstra a forma de atuação de milícia na imposição do negócio frente ao conceito de livre concorrência", afirma o relatório do MP-RJ.
Lessa e seu sócio planejavam a expansão dos depósitos de distribuição de água para áreas dominadas pelo tráfico de drogas, como o Complexo do Lins e Mandela, na zona norte do Rio, além da região da Lapa, no centro.
Uma fonte ligada à investigação do Caso Marielle informou ao UOL que Lessa também pretendia levar seu negócio de distribuição à comunidade de Cidade de Deus, um território dominado pela facção Comando Vermelho que "faz fronteira" com regiões sob jugo de milicianos.
Quando foi preso, Lessa ostentava um padrão de vida acima de seus rendimentos oficiais de R$ 7 mil como sargento da reserva. Ele morava em um condomínio na Barra da Tijuca, cujas casas são avaliadas em pelo menos R$ 3 milhões. O presidente Jair Bolsonaro tem sua residência no Rio no mesmo condomínio.
Lessa comprou por R$ 100 mil uma lancha que usava em condomínio de luxo em Angra dos Reis (RJ). Ele pagou R$ 600 mil por um lote do condomínio, como revelou reportagem do UOL.
O UOL ligou para o celular e mandou mensagens por email e pelo aplicativo de WhatsApp de Fernando Santana, advogado de Lessa, para que ele comentasse as informações contidas no documento do MP-RJ. Até a publicação da reportagem, ele não havia respondido.
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