MARCO ANTÔNIO MARTINS
Em 2011, durante o julgamento que condenou três homens por um assassinato na zona oeste do Rio, a juíza Simone Ferraz resumiu a situação de moradores de favelas.
"Há um novo câncer social. Somos hoje um povo doente, em especial a cidade do Rio, somos pacientes terminais de um tumor chamado milícia."
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Ao olhar para o mapa hoje, entende-se o que queria dizer a juíza. Em 2004, seis favelas na capital eram controladas por milícias. Dez anos depois, são 148 em 28 bairros, segundo a Secretaria de Segurança.
O fenômeno, então restrito à capital, cresceu e hoje está em 23 dos 90 municípios do Estado, em 195 comunidades. Esse crescimento mostra que a prisão de 864 milicianos desde 2007 no Rio não freou a expansão desses grupos.
Se há uma década as milícias "vendiam" a ideia de comunidades sem traficantes, o passar do tempo revelou a exploração dos moradores.
Policiais militares, bombeiros, ex-policiais, militares e moradores das comunidades, que formam as milícias, descobriram que favelas são lugares para se ganhar dinheiro e até investir em eleições.
No início, milicianos candidatavam-se -entre 2007 e 2010, três se elegeram vereadores, foram presos e perderam seus cargos, assim como o deputado estadual Natalino Guimarães, criador da Liga da Justiça, a maior milícia do Rio.
Hoje, os criminosos preferem apoiar candidatos. Há denúncias de que as favelas são "vendidas" para o candidato ser o único a fazer campanha no local.
"O Rio é igual à Chicago dos anos 1930, em que agentes do Estado estavam envolvidos na corrupção. Lá, a solução foi chamar policiais de fora da cidade. Aqui, precisamos encontrar uma", diz o promotor Jorge Magno Vidal.
As quadrilhas começam cobrando por segurança. Depois, moradores são obrigados a comprar botijões de gás, TV a cabo, internet.
Numa comunidade em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, por exemplo, os milicianos cobram R$ 10 de cada casa que quiser ter água. O registro é aberto por meia hora.
REPRESSÃO INEFICAZ
Ao utilizar a tática de prender milicianos -já utilizada para tentar reprimir o tráfico-, a polícia se mostrou incapaz de inibir esses grupos.
A diferença é que, neste caso, o crime é praticado por agentes do Estado, com acesso a informações privilegiadas das ações da polícia.
"A substituição do comando segue a hierarquia do tráfico: prendeu um, já tem outro para substituí-lo", diz o sociólogo Paulo Storani, ex-instrutor do Bope, da PM.
Exemplo disso está em Campo Grande. Pouco mais de 20 dias após a prisão de 21 membros da Liga da Justiça, a milícia -que usa o símbolo do Batman- reestruturou-se. No lugar do ex-PM Marcos José Gomes, o Gão, entraram o ex-preso Jaime Soares Filho, o Mão de Seda, e Carlos Braga.
A dupla já foi vista indicando candidatos para os moradores votarem. Na sexta (29), foi preso Pablo Moraes, suspeito de fazer cobranças em nome dos milicianos.
Em dez anos, milícias passam de 6 para 148 favelas na cidade do Rio - 01/09/2014 - Cotidiano - Folha de S.Paulo
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Ao olhar para o mapa hoje, entende-se o que queria dizer a juíza. Em 2004, seis favelas na capital eram controladas por milícias. Dez anos depois, são 148 em 28 bairros, segundo a Secretaria de Segurança.
Se há uma década as milícias "vendiam" a ideia de comunidades sem traficantes, o passar do tempo revelou a exploração dos moradores.
Policiais militares, bombeiros, ex-policiais, militares e moradores das comunidades, que formam as milícias, descobriram que favelas são lugares para se ganhar dinheiro e até investir em eleições.
No início, milicianos candidatavam-se -entre 2007 e 2010, três se elegeram vereadores, foram presos e perderam seus cargos, assim como o deputado estadual Natalino Guimarães, criador da Liga da Justiça, a maior milícia do Rio.
Hoje, os criminosos preferem apoiar candidatos. Há denúncias de que as favelas são "vendidas" para o candidato ser o único a fazer campanha no local.
"O Rio é igual à Chicago dos anos 1930, em que agentes do Estado estavam envolvidos na corrupção. Lá, a solução foi chamar policiais de fora da cidade. Aqui, precisamos encontrar uma", diz o promotor Jorge Magno Vidal.
As quadrilhas começam cobrando por segurança. Depois, moradores são obrigados a comprar botijões de gás, TV a cabo, internet.
Numa comunidade em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, por exemplo, os milicianos cobram R$ 10 de cada casa que quiser ter água. O registro é aberto por meia hora.
REPRESSÃO INEFICAZ
Ao utilizar a tática de prender milicianos -já utilizada para tentar reprimir o tráfico-, a polícia se mostrou incapaz de inibir esses grupos.
A diferença é que, neste caso, o crime é praticado por agentes do Estado, com acesso a informações privilegiadas das ações da polícia.
"A substituição do comando segue a hierarquia do tráfico: prendeu um, já tem outro para substituí-lo", diz o sociólogo Paulo Storani, ex-instrutor do Bope, da PM.
Exemplo disso está em Campo Grande. Pouco mais de 20 dias após a prisão de 21 membros da Liga da Justiça, a milícia -que usa o símbolo do Batman- reestruturou-se. No lugar do ex-PM Marcos José Gomes, o Gão, entraram o ex-preso Jaime Soares Filho, o Mão de Seda, e Carlos Braga.
A dupla já foi vista indicando candidatos para os moradores votarem. Na sexta (29), foi preso Pablo Moraes, suspeito de fazer cobranças em nome dos milicianos.
Em dez anos, milícias passam de 6 para 148 favelas na cidade do Rio - 01/09/2014 - Cotidiano - Folha de S.Paulo