PRECONCEITO
Com medo de sofrer discriminação, militares preferem esconder a orientação sexual perante os colegas de farda. Sargento da Polícia Militar que decidiu assumir garante que é respeitado pela corporação
O comando da Polícia Militar não se manifesta. As chefias preferem o silêncio. Mas nem por isso o assunto deixa de existir. O tabu da homossexualidade dentro dos quartéis é enfrentado pelos que vestem farda no exercício de suas funções profissionais. Para o terceiro sargento Itamar Matos de Souza, 26 anos, o motivo para superar o preconceito foi um só: cansou de se esconder.
¿¿Antes, convivia com as cobranças. Todo mundo queria saber se eu tinha namorada¿¿, conta. Seguro de que conquistou o respeito dos colegas, o PM sabe que o preconceito existe, apesar de não se manifestar. ¿¿As pessoas mais velhas têm dificuldade de compreender e sei que se sentem incomodadas, mas a convivência tem sido tranqüila.¿¿
Na Polícia Militar desde 1996, Itamar assumiu a homossexualidade há quatro anos e agora decidiu tornar pública a sua orientação. No currículo, nada que desabone sua conduta perante superiores e subordinados. Gosta de ser militar, carreira que escolheu por sugestão do pai. Tinha 18 anos quando fez o concurso para soldado.
Hoje, reconhece que é um caso raro entre os colegas que, por insegurança e medo de represálias, se mantêm anônimos. ¿¿Há outros homossexuais na PM, mas cada um tem o seu momento de se assumir¿¿, diz. Uma de suas maiores preocupações é com a formação dos jovens militares: ¿¿Os policiais são representantes do poder público e por isso não podem ter preconceitos.¿¿
Na opinião de José (nome fictício), oficial da PM também homossexual, é possível que em alguns anos a realidade dentro do quartel seja diferente: ¿¿A polícia está evoluindo, mas é preciso se adaptar¿¿. Militar por vocação, ele nunca pensou em deixar a corporação por causa do preconceito. ¿¿Não assumo publicamente, porque não quero que falem de mim. Se enfrento dificuldades, são mais internas do que no relacionamento profissional¿¿ , explica.
Sem a coragem de Itamar para assumir publicamente a homossexualidade, Pedro (nome fictício) viveu experiência semelhante no Corpo de Bombeiros, onde trabalhou por nove anos. ¿¿O preconceito é velado. As pessoas não dizem, mas ele existe, sim¿¿, conta, lembrando que muitas vezes teve que mentir sobre relacionamentos com mulheres para não ser discriminado.
Aos 28 anos, nega ter saído da corporação por ser homossexual. ¿¿Os motivos foram profissionais¿¿, garante. ¿¿Para mim, as organizações militares precisam reavaliar seus valores e levar o assunto mais a sério, porque é uma realidade. Infelizmente, os militares ainda estão entre os segmentos mais conservadores da sociedade¿¿, afirma.
Ao contrário da Polícia Militar, que preferiu não se manifestar, o comando do Corpo de Bombeiros, por meio da assessoria de imprensa, informou que não faz distinção. Preocupa-se apenas com o fato de o militar ¿ esteja fardado ou não ¿, representar a corporação, formada por 6.300 homens e mulheres. Segundo a assessoria, ¿¿há respeito à vida particular de cada um, desde que não denigra a imagem da corporação¿¿.
Ser humano
A preocupação com o preconceito chegou ao governo federal e faz parte do Programa Brasil sem Homofobia, lançado em maio. Segundo o secretário-executivo do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, Ivair Augusto Alves dos Santos, o programa defende a garantia da igualdade entre todas as pessoas: ¿¿Não vemos a figura do militar, mas a do ser humano¿¿.
O programa prevê a adoção de políticas públicas de capacitação e qualificação de policiais para o atendimento não-discriminatório. Para o líder do Grupo Estruturação, Welton Trindade, um caminho é a alteração do Código Penal Militar, que ainda usa termos como pederastia.
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