PM
garante que desaparecimentos
são investigados com rigor
INSEGURANÇA
Ver um filho desaparecido nas mãos da Polícia Militar é um
sentimento inexplicável, que só quem já passou por isso sabe o que significa.
Este é o drama de pelo menos 12 famílias goianas, que nos últimos cinco anos
tiveram seus filhos arrancados do seio familiar após abordagem policial.
A PM tem desaparecido com os corpos, segundo o
procurador-geral de Justiça de Goiás, Saulo de Castro Bezerra, para acobertar
casos de tortura ou para eliminar testemunhas. O comando da PM, no entanto,
entende que o número de casos é pequeno, se comparado com o tamanho do efetivo
policial, e que a transparência tem sido a marca das investigações sobre os
casos, com todos os envolvidos afastados das ruas até a elucidação e a expulsão
quando há comprovação.
O caso mais recente de desaparecimento foi do estudante
Murilo Soares Rodrigues, de 12 anos, no dia 22 de abril deste ano, na Vila
Brasília. O garoto estava acompanhado do servente de pedreiro Paulo Sérgio
Pereira Rodrigues, 21, que dirigia o carro do pai de Murilo, um Pálio.
Testemunhas contaram que os dois foram abordados por uma equipe da Ronda
Ostensiva Tática Metropolitana (Rotam). Depois de deixarem o local no Pálio,
seguido pelo carro da Rotam, os dois nunca mais foram vistos. O veículo foi
encontrado carbonizado, no Setor Alto do Vale.
O caso está sendo apurado em duas frentes : no Grupo de
Investigações de Homicídios de Aparecida de Goiânia e na Gerência de Correições
da PM. Desde 31 de maio estão presos os sargentos Fabiano Marcelo de Jesus,
Cleiton Rodrigues da Silva e Fernando Gabriel Pinto, o cabo Marcelo Alessandro
Capinam Macêdo e o soldado Thiago Prudente Escrivani.
Os militares negam a abordagem, apesar de provas técnicas
comprovarem o que testemunhas já haviam apontado. Eles serão indiciados por
homicídio ou latrocínio e ocultação de cadáver se os corpos forem encontrados.
Caso contrário, segundo o delegado Rener de Sousa Moraes, eles podem responder
apenas pelos crimes de seqüestro e roubo qualificado.
Os pais de Murilo – o comerciante Orton Rodrigues e a dona
de casa Maria das Graças Soares Lucena Rodrigues – e o único irmão, Orton
Júnior, tentam retomar a vida enquanto acompanham de perto as duas
investigações. A família reconhece que PM e Polícia Civil estão fazendo de tudo
para punir os culpados. “Gostaria de ver as pessoas que fizeram isso punidas
adequadamente”, desabafa Maria das Graças.
Sem provas
O procurador-geral de Justiça de Goiás, Saulo de Castro
Bezerra, relator de um mapeamento que está em curso em todo o País sobre a
aplicação da Lei de Tortura, acredita que o número crescente de pessoas
desaparecidas vitimadas por policiais militares pode estar relacionado a uma
nova forma da polícia para esconder indícios de torturas praticadas. O
objetivo, frisa, é deixar a Justiça de mãos atadas, sem testemunhas ou
elementos para punir os envolvidos.
Para que as pessoas denunciem a polícia que pratica crimes,
ele propõe a criação de programas eficientes de proteção às vítimas e às
testemunhas. Além disso, defende que haja discussões com a sociedade para não
deixar que se banalize a execução de pessoas que já tiveram passagens pela
polícia.
Para o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Marciano
Basílio de Queiroz, o fato de 12 pessoas terem desaparecido depois de
abordagens policiais em Goiás, num período de cinco anos, demonstra que os
casos de desvio de conduta são poucos, se for le vado em consideração o efetivo
de 13 mil homens. “Nós investigamos cada caso com isenção, transparência e
seriedade”, disse.
Basílio de Queiroz reforça que a intenção do comando agora é
a de trabalhar melhor a questão doutrinária com as tropas de elite da
corporação, tidas como as melhores em índices de combate à criminalidade, mas
consideradas as de abordagens mais violentas.
“O Ministério Público reconhece a eficácia dessas tropas de
elite, mas possui grande número de reclamações sobre a violência adotada por
elas, principalmente a Rotam. Há uma institucionalização da truculência da
Rotam, a tal ponto que a população tem medo de ser abordada por ela nas ruas”,
informou um alto membro do MP goiano.
O coronel Marciano Basílio de Queiroz concorda que é
necessária uma intervenção junto a essas tropas para evitar tais problemas com
a sociedade. Um estudo está sendo feito nesse sentido. Mas, de imediato, o
comandante da PM afirma que sem as tropas de elite nas ruas dos municípios
goianos, os bandidos ficariam tranqüilos para cometer crimes.
Familiares de vítimas sofrem à espera de notícias
O serralheiro Alair Ferreira Lima, de 26 anos, desapareceu
na madrugada de 3 de março de 2003 depois de pegar uma carona com o soldado
Geson Marques Ferreira, 33, na porta do 4º Distrito Policial do Jardim
Garavelo, em Aparecida de Goiânia. Alair estava em um bar , quando foi levado
preso por militares até o 4º DP sob a acusação de ter estuprado Maria Helena
Ramos Cardoso, que seria moradora do Jardim Itaipu. O nome da mulher nunca foi
encontrado no Instituto de Identificação da Secretaria de Segurança Pública e
Justiça de Goiás. Também não existem no Jardim Itaipu a Rua W-11, a quadra 49 e
o lote 2, que seria o endereço da vítima de Alair.
Ao ser liberado, Alair pegou carona com o soldado Geson e
nunca mais foi visto. A família do serralheiro disse à polícia que ele tinha
como desafeto apenas um ex-militar, com o qual envolveu-se numa briga por causa
de uma namorada. Para o irmão de Alair, o vendedor João Edson Ferreira Lima,
34, o mais difícil é ver seus pais definhando dia após dia, consumidos com o
sofrimento causado pelo desaparecimento do filho.
A sindicância que investiga o caso apontou como responsáveis
pelo desaparecimento de Alair o tenente reformado Divino José de Oliveira, o
cabo Gilvan de Oliveira e os soldados Geson Marques Ferreira e Rondinele Souza
Oliveira. Todos responderam ao Conselho de Disciplina da PM, que aguarda
decisão judicial sobre o caso.
O adolescente Hélio Barbosa da Silva, 13, desapareceu
recentemente no Setor Mandu 2, em Luziânia, depois de ser colocado à força por
dois homens em um Gol vinho. Hélio seria testemunha de acusação em um
julgamento cujo réu é um militar da cidade. Uma sindicância para apurar um caso
de lesão corporal contra Hélio já havia sido instaurada em 2003, mas foi
arquivada. O Ministério Público estadual sugeriu à Gerência de Correições da PM
que revise o caso e proceda uma investigação sobre o paradeiro de Hélio.
Medo
A costureira Eunice Mendonça Silva, 43, disse ter pavor de
aparecer para denunciar o desaparecimento do filho, o pedreiro Marcelo Mendonça
da Silva, 19. “Tenho medo de aparecer, porque quem deu sumiço no meu filho é da
Polícia Militar”, diz. Marcelo desapareceu em 17 de fevereiro deste ano, quando
andava com Anselmo Ceciliano Barbosa pela GO-040, no Setor Madre Germana 2.
De acordo com o inquérito do Grupo de Investigações de
Homicídios (GIH) de Aparecida, dois homens armados de revólveres desceram de um
Gol branco, sem placas, efetuaram vários disparos para o alto para intimidar as
pessoas que estavam nos arredores e renderam Marcelo e Anselmo. Os dois foram
algemados e colocados no veículo, que seguiu rumo a Aragoiânia. O corpo de
Anselmo foi encontrado e o de Marcelo, não.
Marco Aurélio Carneiro da Costa, 35, e Rogério Gomes Souza,
22, estão desaparecidos desde 6 de outubro de 2004. Marco Aurélio estava em um
ponto de tráfico de drogas comprando merla, no Setor Goiânia Viva, Região Leste
de Goiânia. Ao voltar para casa, encontrou-se com Rogério. Segundo testemunhas,
os dois foram rendidos por duas equipes da Rotam no percurso e colocados em
carros separados. Os dois nunca mais foram vistos. Os supostos envolvidos estão
trabalhando internamente na corporação.
brazil.indymedia.org/content/2005/07/323233.shtml
Nenhum comentário:
Postar um comentário