Essa e a verdadeira cara da nossa Segurança Publica

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sexta-feira, 5 de abril de 2013

O jogo de empurra entre guardas municipais e PMs


Enviado por Ludmila Lima e Elenilce Bottari - 
30.3.2013
 | 
12h21m
INSEGURANÇA


Do jornal O GLOBO deste sábado, 30 de março:
RIO — Se jogo de empurra fosse modalidade esportiva, policiais militares e guardas municipais poderiam conquistar o ouro nas Olimpíadas. Com efetivos que somam mais de 30 mil agentes na capital, eles estão nas ruas do Rio para atender à população e proteger o patrimônio da cidade. Só que, na prática, nem sempre o carioca recebe o tratamento que merece. Como a divisão de algumas atribuições é imprecisa, há quem se aproveite e acabe deixando quem precisa de segurança na mão. É o clássico “não posso fazer nada”, chavão conhecido dos moradores da cidade.
Uma comerciante da Praça do Lido, em Copacabana, sabe bem o significado da expressão popular “filho feio sem pai”. Ela já procurou a Guarda Municipal e a Polícia Militar para tentar solução para um problema crônico da região, mas a falta de interesse em resolvê-lo parece imperar. Cercado pela Escola Municipal Roma, pela orla e por ruas fechadas ao trânsito, a praça conta com grades e com a presença de policiais e guardas. Mas isso não impede que jovens e crianças utilizem o espaço interno para o tráfico e o consumo de drogas e, do lado de fora, pratiquem furtos e pequenos roubos, conta a comerciante, que pediu para não ser identificada:
— À tarde, os meninos que dormem na praia levantam e vêm para cá para roubar nas ruas. Depois que a praça fecha, o tráfico e a prostituição acontecem no calçadão da orla. A PM diz que eles são um problema social, e a Guarda, que são problema de segurança. Eu tenho um porrete do lado do balcão para me defender dos saques — afirma.
À frente da Coordenação Multidisciplinar de Estudos e Pesquisas em Ordem Pública, Polícia e Direitos Humanos da Uerj, Jorge da Silva afirma que, na rua, ao ser procurado pela população, não cabe ao policial ou ao guarda avaliar se o caso é ou não importante, devendo o servidor, como representante do Estado, socorrer ou atender.
— Não interessa ao cidadão que está na rua com problema consultar a Constituição para saber o que fazer. Na primeira instituição pública que vê, você procura por socorro. E ela tem de dar uma resposta. Cada policial ou guarda tem de entender que ali ele é um braço do Estado para ajudar a população — diz Jorge da Silva, professor de Direito da Uerj.
Pediu ajuda e acabou algemada
Pela Constituição, a Guarda Municipal é instituída pelos municípios para a proteção de seus bens, serviços e instalações. Já a Polícia Militar tem como função o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. A Polícia Civil é encarregada da apuração dos crimes e da preparação da documentação que é enviada à Justiça.
— No jogo de empurra, quando o filho é bonito todo mundo aparece para sair na foto. Quando é feio, ninguém é o pai — diz Jorge da Silva.
O publicitário Henrique Alqualo se viu tonto com a postura da GM diante de um assalto no Largo do Machado.
Ele viu uma dupla roubando um motorista parado no sinal e contatou um grupo de guardas que estava próximo.
— Quando eu contei do assalto, disseram que eu tinha que falar com a polícia. Disseram “eu não posso fazer nada” — lembra Henrique. — Logo depois, vi outros guardas municipais correndo em direção aos assaltantes. Não sei quem faz o quê. Para mim, o guarda está na rua também para zelar pela segurança.
Coordenador de Prática Jurídica da Fundação Getulio Vargas, o professor André Mendes diz que o poder de polícia exercido pela Guarda Municipal na cidade do Rio está relacionado a atribuições administrativas, entre elas vigiar os espaços públicos, em colaboração com a PM.
— Embora a GM não tenha a função de reprimir, não há impedimento para que promova a prisão em flagrante, já que o Código de Processo Penal autoriza que qualquer cidadão prenda alguém em flagrante.
Ele ressalta que a legalidade da prisão em flagrante pela GM já foi discutida nos tribunais, que a vêm aceitando:
— O ideal é que PM e GM atuem de forma colaborativa na proteção dos interesses sociais. Isso exige sintonia entre os poderes públicos nos níveis municipal e estadual. O diálogo institucional é fundamental. O cidadão pode e deve cobrar políticas públicas articuladas entre as instituições.
Um caso de furto na Praça São Salvador, em Laranjeiras, ganhou contornos dramáticos para a vítima pela inexistência dessa colaboração. Numa noite de sexta-feira do mês passado, uma jornalista que pediu para não ser identificada se viu sem socorro e em situação de total constrangimento. Ela comemorava o aniversário de uma amiga quando teve a bolsa furtada com seus documentos, dinheiro, celular e a chave de casa. Primeiro, ela recorreu a guardas municipais numa caminhonete.
A vítima tinha testemunhas do furto e informações que poderiam levar ao ladrão, que estaria nas proximidades. Mas eles apenas aconselharam que ela procurasse a PM. Sem qualquer ajuda dos guardas municipais, chorando e transtornada, ela tentava encontrar algum policial:
— A guarda disse que não podia fazer nada e que eu teria que procurar a cabine da PM. Foi quando vi passar uma viatura. Bati na janela e pedi ajuda, mas eles continuaram seguindo, e eu corri atrás. Foi quando eles pararam, baixaram o vidro um pouquinho e eu disse “me ajuda”.
Ela recebeu outro não como resposta:
-- Disseram: “Não podemos fazer nada, vá à delegacia”. Arrancaram com o carro, passando por cima do meu pé. Desesperada, xinguei. Eles ouviram, pararam a viatura e me algemaram. É um absurdo, pois não tentei agredi-los. E sou pequena e magra. Mesmo assim, me colocaram na viatura, ao lado de dois moradores de rua que estavam assaltando, e fiquei lá parada e trancada durante uma hora.
O constrangimento só teve fim quando ela pediu para ser levada até a delegacia, para que fossem relatadas ao delegado de plantão as duas versões do ocorrido. Acabou liberada pela PM ali mesmo, na praça. No dia seguinte, os documentos apareceram, de forma misteriosa, perto de sua casa.
Jorge da Silva, da Uerj, diz que parte dessa confusão ocorre porque policiais, tanto civis quanto militares, e guardas municipais não procuram se ater às suas atribuições e invadem os espaços uns dos outros. Também está por trás dessa “bateção de cabeça” o fato de, até hoje, não haver uma lei complementar à Constituição de 1988 disciplinando o funcionamento dos órgãos de segurança pública. Essa lei poderia estabelecer, por exemplo, que treinamentos e equipamentos de trabalho são necessários para o exercício das funções de cada uma das instituições.
A Guarda Municipal do Rio informou que trabalha em parceria com a PM, apoiando o patrulhamento das ruas e encaminhando casos de flagrante às delegacias. E afirmou que determina aos guardas que levem qualquer queixa da população adiante, comunicando à autoridade policial, quando for o caso, ou aos órgãos e às secretarias responsáveis.
A Polícia Militar também afirmou que a GM é uma instituição parceira, que comunica ocorrências e ajuda na vigilância do patrimônio público. A PM ressaltou que mantém há um mês uma patrulha na Praça do Lido e que há patrulhamento a pé na região. A Polícia Civil, em nota, destacou que, se o cidadão estiver em situação de risco e as circunstâncias permitirem, o policial civil tem o dever legal de agir em defesa da sociedade.




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