A chacina da família de PMs e a subcultura da vingança policial
Como uma tragédia desperta os instintos mais baixos da corporação.
A morte de uma família de policiais militares parece ser um caso sem precedentes. Absolutamente chocante ver que até uma criança de 13 anos morreu com um tiro, além de dois parentes que estavam na casa. Luis Marcelo Pesseghini, da Rota, era casado com Andreia Regina Bovo Pesseghini, cabo do 18º Batalhão. Marcelo era o nome do menino.
O que inicialmente foi tratado como uma chacina praticada pelo PCC, segundo a própria polícia militar, foi uma sequência de homicídios praticados pelo garoto, seguido de seu suicídio. O fato de ter sido usada apenas uma arma, e de não haver sinais de arrombamento nem de troca de tiros, praticamente descarta a possibilidade de um atirador do PCC.
A par dessa tragédia, é interessante observar a conduta dos policiais militares ante o episódio. Esse comportamento diz muito sobre a corporação militar e sobre a pessoalidade no trato da segurança pública. Quando ainda se suspeitava de uma chacina, a reação mais parecia de um bando e não de uma corporação institucional.
Chama a atenção a presença no local do crime de dois políticos ex-integrantes da Polícia Militar. O deputado estadual Major Olímpio, segundo o Estadão, entrou no local do crime e deu entrevistas explicando o que ocorreu. É mais que sabido que o local do crime deve ser preservado para o trabalho dos peritos criminais e que a presença de pessoas estranhas ao serviço apenas pode atrapalhar a perícia.
Já o vereador Coronel Telhada, que tem como uma de suas frases prediletas “se eu morrer, vinguem-me”, postou na sua página do Facebook que estava indo ao local “para nos cientificarmos do que realmente ocorreu na chacina”, como se tivesse alguma atribuição no caso.
Em página feita em homenagem ao cel. Telhada e, ao que parece, não administrada por ele, há uma foto da família morta com a frase: “Minha revolta vai passar quando quem fez isso estiver deitado…” Na mesma página, além de diversas postagens contra o que chama de “doutores dos direitos humanos”, há algumas declarações em que claramente se faz a incitação à vingança. Em uma delas, que exibe uma espécie de cartaz com a frase “bandido bom é bandido morto”, o administrador diz que “na Rota ninguém chora o enterro do amigo sem antes promover o do inimigo”. Em outra, há a foto de alguns soldados da Rota enfileirados e armados, com a inscrição: “Mexeu com a família a pegada é outra parceiro”.
Muitos policiais se mostram incrédulos sobre a versão de que o garoto teria sido o autor. Tanto que o próprio Telhada foi hostilizado por ter divulgado essa versão. Alguns disseram que ele estava ocultando a verdade por interesses políticos.
Um policial ouvido por mim afirmou que o clima é de vingança: “Internamente os policiais querem guerra, querem que alguém aponte um indício de que foi uma execução para haver um revide.”
Ao que parece para acalmar a tropa, o comandante geral da PM, cel. Benedito Roberto Meira, divulgou a seguinte nota na intranet corporativa: “As circunstâncias relativas à morte do casal de Policiais Militares e seus familiares estão sendo objeto de investigação; a perícia, inclusive, está em andamento. Assim que tivermos informações consistentes divulgaremos. Seja responsável, não dê crédito a boatos”.
Nessa subcultura, matar policial é crime que se paga com a própria vida. Essa regra está de tal modo arraigada na corporação que muitos fazem publicamente sua apologia. O problema é que essa postura em nada diminui a criminalidade, servindo apenas para acrescer ainda mais violência ao fato ocorrido, agravando a insegurança — de toda a população.
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