Em áudio, PM diz que delegado que prendeu sargento está 'estressadinho'
Sargento foi preso por supostamente ter dado choques em homem detido. Em outro áudio, policial diz que delegado 'só quer fritar' PMs.
21/10/2015 13h35 - Atualizado em 21/10/2015 17h23
Em áudio compartilhado por meio de rede social, policiais militares disseram que o delegado Raphael Zanon, que prendeu o sargento da Polícia Militar Charles Otaga por supostamente torturar um suspeito de um roubo na Zona Leste de São Paulo, estava "estressadinho" e sempre prejudica os PMs em ocorrências, segundo o SPTV.
"QRU é o seguinte: esse delegado aqui do 103, ele está doido da vida com a PM por causa do ciclo completo de polícia, está todo estressadinho. E por causa da resolução 57. Toda ocorrência que é levada pra ele ele quer inverter contra os 'mikes' [gíria usada para policiais]", diz áudio compartilhado em rede social.
"Um tal de um delegado Raphael Zanon, que não gosta da polícia aí, ele declara que odeia a PM, entendeu? Então, está mostrando as garra dele aqui, né? Advogando para ladrão. Oh, pessoal, agora é hora da gente se unir, entendeu? E defender os nossos porque os "charlie" (policial civil) só quer fritar a gente", diz outro áudio.
O ciclo completo de polícia, que pemite às duas polícias atuar tanto nas investigações como em ações ostensivas, é discutido em uma PEC no Congresso.
Já a resolução 57/15 da Secretaria da Segurança Pública determina que em caso de flagrante, o delegado deve providenciar a rápida liberação dos policiais militares, providenciando rapidamente os papéis para que eles assinem e voltem ao policiamento. A resolução afirma que isso deve ser feito apenas após a entrega do recibo do preso e do depoimento dos policiais.
Em nota, a Secretaria da Segurança informou que um "homem foi preso em flagrante após roubar uma loja de sapatos, na manhã de terça-feira (20), em Itaquera. Na delegacia, ele foi reconhecido pela dona do estabelecimento. Durante o registro da ocorrência, o indiciado acusou os policiais militares de tortura. O suspeito passou por exame de corpo de delito, que constatou lesões mas afastou a alegação de agressões por choques elétricos, como citado pelo indiciado. O sargento Charles Otaga foi autuado em flagrante por tortura e permanece preso no Presídio Romão Gomes. Já foi instaurado também um inquérito policial militar para apurar o caso".
Áudio mostra como policial militar se referiu a delegado como 'estressadinho' (Foto: TV Globo/Reprodução)
Protesto e escolta a delegado
O Ouvidor das polícias de São Paulo, Julio Cesar Fernandes Neves, comunicou o corregedor da Polícia Militar e o procurador-geral do Estado que o delegado Raphael Zanon recebeu ameaças de policiais militares direcionadas também à família dele.
O caso levou até a frente da delegacia outros PMs e familiares dos policiais envolvidos. O grupo protestou contra a prisão do sargento. Deputados ligados às polícias Civil e Militar também foram ao local. O delegado Zanon, que determinou as prisões, precisou deixar a delegacia sob escolta de colegas de corporação durante a madrugada.
O Ouvidor das polícias de São Paulo, Julio Cesar Fernandes Neves, comunicou o corregedor da Polícia Militar e o procurador-geral do Estado que o delegado Raphael Zanon recebeu ameaças de policiais militares direcionadas também à família dele.
O caso levou até a frente da delegacia outros PMs e familiares dos policiais envolvidos. O grupo protestou contra a prisão do sargento. Deputados ligados às polícias Civil e Militar também foram ao local. O delegado Zanon, que determinou as prisões, precisou deixar a delegacia sob escolta de colegas de corporação durante a madrugada.
O sargento Charles Otaga deixou o local sob aplausos das pessoas que aguardavam do lado de fora. Ele foi levado pela polícia para o presídio militar Romão Gomes. Os outros policiais militares envolvidos na ação não foram detidos, mas serão investigados. A Secretaria da Segurança Pública, responsável pelas polícias militar e civil, afirmou que apura o caso.
Lesões nas costas de suspeito de roubo na Zona Leste de São Paulo (Foto: Reprodução/TV Globo)
Mudança de versões
O sargento da PM Charles Otaga mudou sua versão dos fatos para justificar as lesões constatadas pelo Instituto Médico-Legal (IML) no pênis do acusado Afonso de Carvalho Trudes. De acordo com o boletim de ocorrência registrado no 103º DP, em Itaquera, primeiramente o PM informou que, assim que deu voz de parada a Afonso, o suspeito desceu de sua bicicleta e ficou em posição para ser revistado, colaborando com a abordagem.
O sargento da PM Charles Otaga mudou sua versão dos fatos para justificar as lesões constatadas pelo Instituto Médico-Legal (IML) no pênis do acusado Afonso de Carvalho Trudes. De acordo com o boletim de ocorrência registrado no 103º DP, em Itaquera, primeiramente o PM informou que, assim que deu voz de parada a Afonso, o suspeito desceu de sua bicicleta e ficou em posição para ser revistado, colaborando com a abordagem.
Depois, após a denúncia de tortura, Otaga voltou atrás no depoimento e afirmou que Afonso tentou fugir quando foi detido. Segundo ele, o suspeito acelerou a bicicleta e pedalou por cerca de 70 metros com um arma de brinquedo presa à cueca, passando rapidamente por lombadas e valetas, o que teria causado os ferimentos em sua genitália.
Afonso afirma que foi torturado pelo policial antes de ser levado à delegacia e que chegou a levar choques no pescoço, na região das costelas e no pênis. Ele conta que uma faca também foi usada pelo sargento Otaga, que a todo momento dizia que iria matá-lo. A tortura teria acontecido na Avenida Luís Mateus e durado cerca de 15 minutos. Um laudo do IML apontou diversas lesões de natureza leve no jovem.
O suspeito foi detido acusado de roubar uma loja de sapatos. A dona do estabelecimento o reconheceu e ele acabou confessando o crime, além de também indicar o nome de um comparsa que o ajudou no assalto. O delegado do 103º DP, Raphael Zanon, decidiu prender, então, tanto o suspeito de roubo como o PM.
Sargento nega
O advogado do sargento Charles Otaga, Fernando Pittner, disse que o criminoso havia confirmado inicialmente que a bicicleta utilizada no roubo foi a responsável por causar as escoriações. A bike foi colocada pela polícia junto com ele no compartimento para presos da viatura, o que teria causado os ferimentos.
Sargento nega
O advogado do sargento Charles Otaga, Fernando Pittner, disse que o criminoso havia confirmado inicialmente que a bicicleta utilizada no roubo foi a responsável por causar as escoriações. A bike foi colocada pela polícia junto com ele no compartimento para presos da viatura, o que teria causado os ferimentos.
Pittner disse ainda que os policiais de fato pararam o carro a caminho da delegacia, mas que a parada só aconteceu para ajustar a posição da bicicleta, à pedido do próprio Afonso, que afirmou que ela o estava machucando. O sargento ainda alegou que aproveitou o momento para também afrouxar a algema do suspeito que estava muito apertada.
Segundo Otaga, esta foi a única parada da viatura na Avenida Luís Mateus e que toda a movimentação da viatura pode ser consultada pelo GPS instalado no veículo. O PM acredita que foi indicado como o autor das torturas apenas por ter "lidado direto" com o suspeito, conforme contou em depoimento à polícia.
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