02:28 / 21 de Novembro de 2011
Além de um duplo homicídio registrado no bairro Pantanal, o grupo é suspeito de praticar outras 17 mortes
A atuação de uma ´milícia´ em dois bairros de Fortaleza pode ser a chave para a elucidar, pelo menos, 17 execuções sumárias ocorridas nos últimos quatro anos. De acordo com as investigações da Polícia Civil, o grupo é comandado por um sargento reformado da Polícia Militar e o irmão dele, um ex-PM.
Vagando à noite em motocicletas pelas ruas do Pan- Americano e Planalto Ayrton Senna (antigo Pantanal), o grupo se apresenta como uma empresa de "vigilância especializada", oferecendo ´proteção´ aos moradores e comerciantes em troca de um pagamento. No entanto, para a Polícia, a atuação dele está diretamente ligada ao tráfico de drogas e aos assassinatos de autoria desconhecida ocorridos desde 2007 nas duas áreas periféricas da Cidade.
O último crime atribuído a essa ´milícia´ ocorreu na madrugada do último dia 27, na Rua Gerôncio Bezerra, no Pantanal, quando bandidos mataram o casal Cláudio Willame da Silva, 22; e Maria Auricélia Santos da Silva, 32.
Seis pessoas supostas integrantes da ´milícia´ foram indiciados no inquérito nº119-00134/2011, instaurado no 19º DP (Conjunto Esperança) que apurou o duplo assassinato. Os crimes variam desde homicídio qualificado até formação de quadrilha.
A investigação concluiu que quatro homens chegaram em motos em frente à residência do casal, além de um veículo Santana, que estava no apoio com mais dois homens.
Um dos pistoleiros, identificado como Francisco Lima Pessoa, 28, o ´Chico da Nazaré´, entrou na casa portando um revólver de calibre 38 cano longo, modelo T.A. (tiro ao alvo) e baleou Maria Aurineide Santos da Silva e executou o casal a tiro.
No mesmo dia do crime, ´Chico da Nazaré´ foi detido por policiais do Grupo Raio, da Companhia de Policiamento de Motos, no bairro Pan-Americano. Ele foi autuado em flagrante acusado de ser matador do casal e lesionar a mulher.
Sargento
No momento da prisão de ´Chico da Nazaré´, o irmão dele, o sargento reformado da PM Paulo Lima Pessoa, 43, teve a arma apreendida, um revólver semelhante ao usado no duplo assassinato. Francisco Pessoa, o ´Chico da Nazaré´ foi indiciado por homicídio e formação de quadrilha. Ele nega participação na dupla execução.
Além dele, responderão pelo mesmo crime os vigilantes José Adilson dos Anjos Silva; Alyson Costa da Silva, 23; e Francisco Milton. Segundo a Polícia, eles estavam nas motos dando apoio na ação criminosa.
Os irmãos Paulo e Fábio Lima Pessoa, sargento reformado da PM e o ex-PM, foram indiciados no inquérito pelo crime de formação de quadrilha.
´QUER BALA?´
Irmãos Pessoa ´mandam´ no bairro Pan-Americano
O delegado Aurélio Araújo, titular do 19º DP (Conjunto Esperança) acredita que as mortes do casal e de outras pessoas, todas envolvidas com o tráfico de drogas no bairro Pantanal, podem ter ligação com a implantação da empresa de segurança no bairro. "Não posso afirmar taxativamente, mas há indícios que apontam para a participação desse grupo em mais 16 mortes ocorridas desde 2007, no Pantanal, o mesmo ano da chegada dele aqui".
Segundo o delegado, desde que assumiu a titularidade da distrital, recebeu dezenas de ligações telefônicas de moradores pedindo o fim da empresa de segurança clandestina. "As pessoas dizem que as mortes de autoria desconhecida aqui nessa região começaram depois da chegada dessa empresa".
Além das mais de dez mortes no Pantanal, o depoimento de uma testemunha sobre a execução do jovem Francisco Márcio Sousa da Silva, no dia 3 de outubro deste ano, no bairro Pan-Americano reforça as suspeitas da Polícia sobre a atuação da milícia nos dois bairros.
Segundo o delegado Aurélio, há indícios de que o grupo seja, na verdade, um braço armado do tráfico de droga com as missões de ´afastar´ traficantes rivais e ´eliminar´ assaltantes e usuários que estivessem devendo. A testemunha disse à Polícia que Francisco Márcio foi assassinado pelos irmãos Francisco Lima Pessoa, o ´Chico da Nazaré´ e Fábio Lima Pessoa, o ´Có´. Isso porque, agonizando, a vítima revelou quem eram os seus matadores. "Quem atirou em mim foi o Chico da Nazaré e o Có", disse antes de ser levado para o hospital e morrer dias depois.
O crime teria sido motivado por uma discussão ocorrida entre Francisco Márcio e outro irmão de ´Chico da Nazaré´, identificado como ´Mamá´.
As testemunhas disseram ainda que os irmãos ´Pessoa´, "aterrorizam" os moradores do bairro fazendo ameaças de morte. "Por toda e qualquer besteira, eles dizem: - quer bala?"
O casal fuzilado no Pantanal também morava no Pan-Americano e havia fugido do local por medo de ser morto pelos milicianos. Parentes das vítimas disseram que depois que eles saíram de lá, ´Chico da Nazaré´ passou a oferecer R$ 100,00 para quem tivesse informações sobre o paradeiro de Cláudio e Aurilene.
Dois dias antes do crime, o acusado descobriu onde eles estavam, passou em frente à casa e foi visto por Aurilene. A mulher disse a testemunhas, que se algo ocorresse com ela, o culpado seria ´Chico da Nazaré´.
A reportagem tentou contato com os responsáveis pela empresa pelos números fornecidos nos cartazes, mas os telefones estavam desligados.
Em depoimento na delegacia, todos os indiciados negam a participação no duplo homicídio e em outros crimes. O sargento reformado Paulo Lima Pessoa disse que a empresa de segurança pertence ao irmão dele, ´Chico da Nazaré´.
Assassinatos
18 pessoas foram mortas desde 2007, no bairro Pantanal. Há indícios de que os crimes misteriosos começaram após a instalação da empresa de segurança no local.
SEM REGISTROS
Não há casos oficiais desse tipo de crime, afirma MP
O Ministério Público (MP) Estadual não tem nenhuma investigação em curso sobre a atuação de policiais militares ou ex-policiais em grupos de milicianos no Ceará. De acordo com o promotor José Francisco de Oliveira Filho, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais, Júri e Controle Externo da Atividade Policial (Caocrim), "oficialmente" não há relatos da participação de ´milícias´ em bairros de Fortaleza.
No entanto, o promotor afirmou que se houver algum caso concreto ou se for provocado por algum órgão ou instituição, o Caocrim investigará com rigor todas denúncias, até "chegar à verdade dos fatos".
O representante do MP lembrou do caso ocorrido no Ceará que foi apontado como ´milícia´. A empresa de segurança do sargento PM João Augusto da Silva Filho, o ´Joãozinho Catanã´, foi alvo de investigação do Ministério Público. "A investigação concluiu e optou pela denúncia dele por homicídio qualificado e concurso de pessoas", disse o promotor José Filho.
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