Quinta-feira, 1 de outubro de 2015
Morre um policial: de quem é a culpa?
Esta semana foi noticiada a morte do soldado Bruno Rodrigues, que trabalhava em uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) na zona norte do Rio de Janeiro. Segundo divulgado pela imprensa, Bruno (que estava à paisana) foi identificado como policial e executado por traficantes da região.
Um inquérito foi prontamente instaurado para apurar o caso e já foram presos sete adultos e apreendidos seis menores, por serem suspeitos de participar do crime.
A morte do Policial Militar ganhou repercussão nas redes sociais e voltou à tona o discurso de que “bandido bom é bandido morto”, bem como ressurgiram criticas à atuação dos Defensores dos Direitos Humanos replicando-se o clichê: “Direitos Humanos são para defender bandidos”. Assim, direta e indiretamente atribuiu-se a culpa da morte aos “Direitos Humanos”.
Colocamos os Direitos Humanos no banco dos réus. E como causídicos, passamos a apresentar a tese defensiva:
Caros leitores, a expressão "bandido bom é bandido morto" é decorrente do discurso de tolerância à guerra contra o crime, o que significa dizer que esta ideia, bastante cultuada, contribui significativamente para a morte de muitos agentes das forças de segurança. É preciso, portanto, ter muito cuidado para não incentivarmos e perpetuarmos um discurso de ódio e intolerância, legitimando a violência. Precisamos saber de onde falamos e reconhecer nosso lugar de fala.
Quando se fala na condição de vítima de um crime (ou nos colocamos no lugar da vítima) podemos expressar raiva, emoção, desejo de vingança e até desejar a morte do “bandido”, o Estado não. O Estado (representado por seus agentes) deve se pautar pela legalidade.
Neste contexto, o Estado são homens e mulheres fardados que atuam conforme a política ditada pelo governo e assim, por vezes, persuadidos pelo discurso "do bem contra o mal", que facilmente seduz, buscam a paz pela guerra.
Mas a guerra só gera vítimas e mais vítimas… Ações violentas da polícia são vingadas pelo crime organizado (e também pelo desorganizado) que passam a atacar policiais (fora do horário de serviço). O alvo são os bons policiais, aqueles comprometidos com a sociedade e que não se deixam corromper. E como alvo que são, perdemos.
E assim, num moto-contínuo, a violência contra policiais resulta em novas retaliações contra suspeitos, vive-se em um ciclo de violência sem fim. O crime revida, por vezes, inocentes pagam com a vida e suspeitos com a restrição da liberdade.
Por outro lado, os Defensores dos Direitos Humanos não defendem apenas pobres, pretos e prostitutas. Os Defensores dos Direitos Humanos são partidários de um tratamento igualitário, homogêneo e universal para todos, sem distinguir ou levar em conta raça, cor, etnia, condição social ou opção sexual. Os Defensores dos Direitos Humanos também não acreditam que a pobreza seja a causa da criminalidade, mas que a desigualdade social e a ambição têm força significativa de influência em relação aos crimes urbanos. Os Defensores dos Direitos Humanos não compactuam com a violência, defendem a integridade física de quem quer que seja e são favoráveis à legalidade e à busca da justiça por meio do devido processo.
Os Defensores dos Direitos Humanos também não festejam a punição indiscriminada de policiais, pelo contrário, acreditam que “punir policiais é a forma que o Estado tem de não se comprometer com a sua própria política” [1].
Os Defensores dos Direitos Humanos repudiam as armas, a tortura e a morte como meio de resolução de conflitos. Repudiam, portanto, a morte de estudantes, médicos, engenheiros, pedreiros, garçonetes… não pela profissão escolhida, mas por serem pessoas de direitos; portanto, abominam igualmente a morte de policiais, vítimas da mesma lógica de extermínio que buscam combater.
Em síntese, “o pressuposto ético da teoria critica dos direitos humanos, mormente no âmbito das práticas punitivas, é o reconhecimento de todos os seres humanos como humanos”, ou seja, como sujeitos de proteção, “para além dos ideais de pureza e falsas dicotomias (bem vs. mal vs. belo vs. feio; verdadeiro vs. falso; justo vs. injusto) [2]. Portanto, os direitos humanos, decorrentes de conquistas históricas de afirmação da dignidade de toda pessoas humana, se constitui como “patrimônio da humanidade” [3].
Defendemos os Direitos Humanos e não compactuamos com a morte de policiais. Nossas observações são extraídas da realidade vivida, pois a história nos mostra alguns caminhos que não devem ser seguidos, ou seja, precisamos conhecer a nossa história e a história dos nossos países vizinhos, pois "quem não conhece sua própria história está condenado a repeti-la".
Estamos repetindo… Estamos matando, estão nos matando e estão matando policiais, mata-se e morre-se, a violência aumenta a cada dia e você percebe. Por isso é necessário mudar a fala, é preciso ter responsabilidade no discurso pelo bem da segurança pública e dos policiais. Não são os Direitos Humanos que defendem a Lei de Talião, consistente em uma política “olho por olho e dente por dente”, também não são os Direitos Humanos que colocam policiais em áreas carentes, vulneráveis e os deixam desamparados em zona de risco. Seriam então os defensores dos Direitos Humanos os verdadeiros Culpados? Certamente não. Contudo, se injustamente condenamos forem, a história os absolverá. Nada mais.
Karina Camargo Boaretto Lopes é Mestre em Educação pela Universidade da Região de Joinville; Especialista em Direito Penal e Direito Processo Penal; Professora de Processo Penal e Prática Processual Penal; Advogada e sócia no escritório MRL Advogados. https://www.facebook.com/karina.c.boarettolopes.5
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