O conteúdo inteiro de uma conversa gravada por meio de escuta telefônica entre o diretor do presídio PB-I, C. Lima, e um informante do Serviço de Inteligência da Polícia Militar, João Vitor, revela a existência de suposto esquema de propina dentro da Delegacia de Repressão a Entorpecentes em João Pessoa que abala indelevelmente a autoridade de uma das maiores referências policiais do Estado, o delegado Walter Brandão, designado recentemente, em caráter especial, para acompanhar as investigações do assassinato do advogado Manoel Mattos, morto em Pitumbu no dia 24 passado.
Obtida com exclusividade pelo PB Agora, a conversa, gravada em julho de 2008, revela que o suposto esquema resultaria na liberação ilegal de traficantes que atuam na Grande João Pessoa, após pagamento de propina. “A mulher de André Quirino (suposto traficante) foi presa, pra ela não ser enrolada, uma pessoa me garantiu, que o advogado levou R$ 20 mil em cédulas de cem e de cinquenta pro gabinete de Walter Brandão, e eu pensando que ele era um cara honesto”, diz o informante ao diretor do presídio, que já foi da P2 da Polícia Militar.
Na conversa, João Vítor conta a história de um cunhado que foi preso por Walter Brandão sob acusação de tráfico de drogas e que recebeu a proposta de ser liberado caso pagasse R$ 15 mil. “Porque eles queriam R$ 15 mil para meu cunhado ser solto, o Walter Brandão. Minha sogra ia vender a casa para arrumar os R$ 15 mil para ele ser solto. Ele não é traficante. Eu disse a minha mulher que era bom que ele fosse traficante e vendesse pedra para dar dinheiro a esse "miséra". Eles ficaram irados comigo. Fizeram o seguinte: arrumaram oito provisórias. Quem tinha dinheiro saiu, ele não se renovou “, diz o informante.
“Dízimo” evitaria batidas regulares na Cracolândia
De acordo com o teor da conversa, que durou cerca de 15 minutos, junto com agentes da Entorpecentes, o delegado Walter Brandão chega a cobrar R$ 1 mil toda semana para “aliviar” as batidas policiais na Cracolândia em João Pessoa. O pagamento é chamado de “dízimo”. “Givanilson me disse que eles (Walter Brandão e equipe) prenderam uma turma uma vez, aí escutaram o cara falando: meu amigo, a gente dá dinheiro a vocês para quê? Os caras estão vindo aqui quebrar todo o dia rapaz. Fala com os caras para dar um tempo aqui, rapaz, que não ta dando certo desse jeito não. Assim nós vamos deixar de pagar”, conta o próprio diretor do presídio PB-I.
Esquema contaria com participação de advogados
O suposto esquema, de acordo com a conversa, era iniciado com um advogado “magro e alto” que fazia a proposta para sumir com as provas e liberar o preso no mesmo dia do pagamento. “ Tem um advogado, que terminou Direito com Walter Brandão, ele só faz jogo se for com esse advogado, um magro alto. "Eu fui lá com minha mulher e minha sogra, ele disse: se der R$ 15 mil tiro ele hoje, porque me dou muito bem com o delegado”, disse. Fontes revelaram ao PB Agora que o advogado, cujo o nome não é citado na escuta, é irmão de Brandão. Na história, João Vítor se mostra indignado pelo fato de ver a sogra estar querendo vender a casa para poder pagar os R$ 15 mil supostamente acertados com o advogado e Walter Brandão. “A velha (sogra) endoidou para vender a casa, e eu disse que não vendesse, se vender eu vou ao Ministério Público”, declarou na conversa.
Juiz desconfiaria do suposto esquema, diz informante
Durante toda conversa, o diretor do presídio PB-1 reafirma que o delegado de Entorpecentes já é habitual na prática de recebimento de propinas. “Eu fiquei muito desconfiado de como é que um delegado assume um local daquele, porque aquela turma todinha tem denúncia, o Duarte, o Walter, o Farias, o César, tudo ali pega dinheiro nas bocas de tráfico, não sei como que esses caras já não caíram”, diz C. Lima.
Que acrescenta: “Um cara novo se meter num negócio desse”. João Vítor diz que já viu gente entrando presa com mais de um quilo e meio de pedra e saindo horas depois. O crime de tráfico de drogas é considerado hediondo e não permite pagamento de fianças para liberação. Ele conta que um juiz , cujo nome também não foi revelado, chegou a desconfiar das práticas e teria dito, após uma liberação de supostos traficantes: “Estou igual marido traído, que só sabe das coisas depois”.
De acordo com o artigo 21 da Lei de Entorpecentes, ocorrendo prisão em flagrante, a autoridade policial fará comunicação imediata ao juiz competente, remetendo-lhe juntamente uma cópia do auto lavrado e o respectivo auto nos 5 (cinco) dias seguintes.
“Eu sei que com essas provisórias os bichos já arrumaram mais de R$ 50 mil, só que o juiz estranhou”, diz o informante na conversa.
“Eu sei que com essas provisórias os bichos já arrumaram mais de R$ 50 mil, só que o juiz estranhou”, diz o informante na conversa.
Segundo informações obtidas pelo PB Agora, a gravação foi feita dentro da Secretaria de Segurança Pública. No lugar de investigação, Walter Brandão foi premiado com a designação especial para acompanhar o caso do Manoel Bezerra de Mattos Neto, que chamou a atenção da imprensa nacional, por se tratar da execução de um advogado atuante contra os crimes de extermínio no Nordeste e uma das testemunhas da CPI do Extermínio.
Ao nomear Walter Brandão, o secretário estadual de Segurança Pública, Eitel Santiago, ressaltou a confiança inspirada pelo delegado. O governador Cássio Cunha Lima (PSDB), no entanto, defendeu que o caso fosse repassado para responsabilidade da Polícia Federal.
Ao nomear Walter Brandão, o secretário estadual de Segurança Pública, Eitel Santiago, ressaltou a confiança inspirada pelo delegado. O governador Cássio Cunha Lima (PSDB), no entanto, defendeu que o caso fosse repassado para responsabilidade da Polícia Federal.
Walter Brandão nega acusações e diz que “mexe com gente poderosa”
Ouvido pela reportagem do PB Agora, o delegado Walter Brandão negou as acusações feitas pela conversa entre o informante da PM e o diretor do presídio PB-I, penitenciária modelo da Capital. Ele declarou que a Delegacia de Repressão e Entorpecentes registrou um aumento de 1.000% na apreensão de drogas deixando “muita gente poderosa” descontente.
“Estamos contrariando todos os dias pessoas poderosas, pessoas com poder aquisitivo, e é até comum que essas pessoas usem desse artifício para comprometerem o trabalho da gente. Mas estou consciente da lisura do meu trabalho e vamos continuar trabalhando com o mesmo ritmo e estilo que adotamos e quem estiver vestindo a carapuça que aguente”, declarou. Ele disse ainda que a DRE tem muitos procedimentos investigatórios envolvendo policiais militares no mundo do tráfico, com alguns deles entrando em presídios para entregar drogas. Walter Brandão assegurou a lisura dos procedimentos de todos os seus agentes. “Se não tivesse confiança neles não estariam comigo”, declarou.
O delegado solicitou cópia da gravação para tomar as devidas providências de investigação.
Fonte: PB Agora
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