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quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Somente depoimento policial não vale para condenação

 AUSÊNCIA DE CERTEZA

Somente depoimento policial não vale para condenação

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O depoimento policial, por si só, não vale como prova suficiente para a condenação em processo criminal. Com esta conclusão, a 4ª Vara Criminal de Vitória (ES) absolveu um jovem acusado de tráfico de drogas, expediu o alvará de soltura e determinou a devolução do dinheiro encontrado em seu bolso.

De acordo com os autos, o jovem foi visto em um beco conhecido por abrigar intenso tráfico de drogas. Os policiais que estavam no local afirmaram tê-lo visto entregar e receber algo de uma adolescente. Com ela encontraram 12 pedras de crack e um papelote de cocaína. No bolso do acusado havia R$ 90.

Ao longo do processo foram ouvidos um dos dois policiais, a adolescente, uma amiga dela, o réu e sua mãe. O policial disse ter visto a entrega do dinheiro, apesar da pouca iluminação no local. A adolescente e a amiga negaram ter comprado droga do acusado. O réu negou a acusação e disse que recebeu o dinheiro de sua mãe para ir a uma festa de carnaval, para onde se dirigia quando foi abordado e preso pelos policiais. A mãe confirmou.

No momento da abordagem policial, havia outras pessoas no local, de acordo com os depoimentos. No entanto, elas não foram ouvidas no processo. A juíza Rosa Elena Silverol não entendeu o motivo.

Na sentença, ela deixa claro que os depoimentos policiais são prestigiados pela doutrina e pela jurisprudência, mas não podem ser analisados de forma isolada. São necessárias outras provas nos autos para fundamentar uma condenação. “A simples condição de policial não traz garantia de ser o mesmo considerado infalível em suas ações, especialmente naquelas decorrentes da sua função, exercida, quase sempre, em situação de intenso estresse”, observou a juíza.

No caso analisado, a juíza considerou frágil o depoimento do policial. E ressaltou que a condenação anterior do réu, destacada pelo Ministério Público na denúncia, não deve interferir nas provas e na materialidade do processo posterior.

De acordo com a sentença, de fato, há uma probabilidade de os fatos descritos pela acusação terem ocorrido. Entretanto, no processo criminal deve haver provas. Não podem existir dúvidas. “Não ausência de certeza quanto à acusação, vigora o princípio do in dubio pro reo”, concluiu a juíza.

Leia a sentença:

Processo : 0006620-40.2012.8.08.0024 (024.12.006620-4)
Petição Inicial : 201200199270
Situação: Tramitando
Ação : Penal Pública Comum
Natureza : Toxicos
Data de Ajuizamento: 23/02/2012
Vara: VITÓRIA - 4ª VARA CRIMINAL
Distribuição Data: 27/02/2012 17:08
Motivo: Redistribuição por Sorteio
Partes do Processo
Autor MINISTERIO PUBLICO
Réu V. M. J.
999981/ES - DEFENSOR PUBLICO
Vítima AS
Juiz: ROSA ELENA SILVEROL

PROCESSO Nº 024.12.006620-4

S E N T E N Ç A

Vistos etc...

O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de V. M. J., qualificado nos autos, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput, da Lei 11.343/06 e art. 244-B, da Lei 8.069/90, na forma do art. 70, do Código Penal.

Narra a denúncia que:

[...] no dia 10 de fevereiro de 2012, por volta das 22 horas e 30 minutos, no beco 05, bairro Ilha do Príncipe, Vitória – ES, o denunciado V. forneceu drogas conhecidas como crack e cocaína (auto de apreensão de fls. 15 e auto de constatação provisório de substância tóxica de fls. 06) a uma adolescente, quando foi visto por Policiais Militares.

Emerge dos autos que Policiais Militares, se dirigiram ao mencionado local, por ser conhecido como onde há imenso tráfico de drogas, pararam em um terreno baldio e ficaram observando a movimentação, escondidos por um muro.

Consta que os Policiais viram o momento em que o denunciado V. forneceu treze pedras da droga conhecida como crack à adolescente Jennifer e esta lhe entregou a quantia de noventa reais em dinheiro, oportunidade em que os abordaram, procederam a busca pessoal e apreenderam a droga em poder da adolescente e o dinheiro em poder do denunciado V., conforme auto de apreensão de fls. 15. [...]”

No Inquérito Policial, iniciado por auto de prisão em flagrante, constam: declarações; Auto de Constatação Provisória de Substância Tóxica (fls. 06); Auto de Apreensão de 12 (doze) pedras de substância similar a crack, 01 (um) papelote de substância similar a cocaína e a quantia de R$ 165,00 (cento e sessenta e cinco reais) em espécie (fls. 15); Boletim Unificado (fls. 18/19); decisão convertendo a prisão em flagrante em preventiva (fls. 47/49).

Oferecida a denúncia (fls. 02), foram determinadas a notificação do acusado para os fins do art. 55 da Lei 11.343/06, a destruição das drogas apreendidas, bem como a requisição dos Laudos Toxicológico, de Lesões Corporais e de Exame Clínico, mantida a prisão cautelar (fls. 04).

Certidão com registro em desfavor do acusado do processo nº 024.110.162.971, desta 4ª Vara Criminal, que o condenou à pena de dois anos e seis meses de reclusão, substituída por prestação de serviços à comunidade (fls. 03 e 36).

Laudo de Exame de Lesões Corporais do acusado (fls. 11).

Notificado (fls. 12v.), o acusado apresentou defesa preliminar (fls. 21/28).

Laudo de Exame Químico (fls. 17/19).

A denúncia foi recebida em 17/05/2012 (fls. 30/31) e o acusado citado pessoalmente (fls. 37v.).

Realizada a audiência de instrução e julgamento, o acusado foi interrogado e ouvida 01 (uma) testemunha arrolada pelo Ministério Público e 01 (uma) arrolada pela defesa. O Ministério Público apresentou alegações finais orais, requerendo a condenação do acusado nas iras do art. 33, caput, c/c art. 40, inc. VI, ambos da Lei 11.343/06, com a incidência da agravante de pena da reincidência (fls. 38/40 e 54/60).

A defesa apresentou alegações finais na forma de memoriais, discorrendo de forma pormenorizada acerca das provas existentes nos autos, aduzindo que existem contradições entre elas. Que o depoimento do único policial ouvido em Juízo não é firme o suficiente para a condenação do acusado no tráfico de drogas e, por isso, deve ser aplicado o princípio do In Dubio Pro Reo (fls. 64/71).

É o breve relatório. Fundamento e decido.

Finalizada a instrução, o Ministério Público apresentou alegações finais requerendo a condenação do acusado nas iras do art. 33, caput, com a incidência da causa de aumento do art. 40, inc. VI, da Lei 11.343/06, além da agravante da reincidência.

A defesa, por sua vez, requereu absolvição do acusado com supedâneo no princípio do In Dubio Pro Reo, sustentando que as provas produzidas nos autos não são suficientes à ensejar o édito condenatório pretendido pelo Ministério Público.

A materialidade do tráfico de drogas encontra-se demonstrada no Inquérito Policial pelos Autos de Apreensão (fls. 15), de Constatação Provisória de Substância Tóxica (fls. 06) e de Exame Químico (fls. 17/19), onde os Senhores Peritos atestaram que as substâncias apreendidas contêm benzoilmetilecgonina, conhecida como crack.

Quanto à autoria, vejamos:

Ao ser ouvido pela autoridade policial, o acusado V. negou os fatos, dizendo que os noventa reais que trazia consigo lhe foram entregues pela mãe (fls. 04, do IP). Em Juízo, o acusado V. deu a mesma versão. Vejamos (fls. 39/40):

[...] foi preso perto de sua casa; não conhece a adolescente J. e não viu quando a polícia a apreendeu; estava com R$ 90,00 que sua mãe havia lhe dado para passar o carnaval; não viu apreensão de drogas nesse dia; não sofreu nenhum constrangimento quando prestou depoimento na polícia; confirma o depoimento prestado na fase policial, constante de fls. 04 do IP e esclarece que já viu J. algumas vezes no bairro. […] na ocasião que foi preso estava indo para o carnaval do Sambão do Povo, local onde vários de seus amigos e conhecidos também se encontravam. [...]” (grifei).

Em poder do acusado V., foram apreendidos somente os noventa reais em dinheiro e nada mais, conforme consta do Auto de Apreensão nº 264/2012 (fls. 15, do IP).

Às fls. 61 foi juntada declaração firmada pela genitora do acusado, R. C. M., afirmando que havia dado ao acusado a quantia de noventa reais para ele ir ao carnaval, pois é trabalhador, não é traficante e estava prestando serviços em uma peixaria na Vila Rubim.

A testemunha B. C. R., que acompanhava o acusado no momento da abordagem e prisão, não foi ouvida pela autoridade policial, não se sabe porquê, como ressaltado pela defesa. Ouvida em Juízo, declarou o seguinte (fls. 59/60):

[...] na época dos fatos trabalhava como motoboy; no dia dos fatos tinha acabado de sair da casa de seu irmão e se dirigia ao ponto da Vila Rubim, objetivando ir para a sua casa; encontrou com o acusado na descida do beco da Rua Jurema Barroso; no momento que desciam juntos o beco, foram abordados por uma guarnição da policia; logo após ser abordado o depoente foi liberado, mas não sabe dizer porque o acusado V. ficou preso, podendo afirmar, com certeza, que os dois foram abordados juntos e na mesma ocasião, mas revistados por policias diferentes; apenas o depoente e o acusado estavam andando em conjunto; primeiramente ocorreu a abordagem dos adolescentes logo após foi efetuada a abordagem em relação ao depoente e o acusado; conhece somente uma adolescente moreninha de vista; não tem relacionamento com nenhuma das adolescentes; não viu o acusado portando nenhuma droga; o acusado falou ao depoente que estava indo para o carnaval; o acusado estava de calça jeans e camisa, com roupa normal; o depoente não foi conduzido ao DPJ sendo liberado no mesmo instante da abordagem; presenciou a abordagem em relação ao acusado; conhece o acusado há vários anos; sabe que a mãe do acusado é dona de casa e seu pai pedreiro; não pode afirmar se a mãe do acusado também trabalhava como diarista; o beco onde ocorreu a abordagem é pouco iluminado; não se recorda de quantos policiais era formada a guarnição, podendo somente afirmar que eram mais de dois policiais. […] entre a abordagem do depoente e do acusado e a abordagem das adolescentes, ocorreu um intervalo de dez a quinze segundos, pois foi tudo muito rápido; as primeiras a serem revistadas foram as adolescentes que estavam a uma distância de quatro a cinco metros do depoente e do acusado e depois dessa revista é que o depoente e acusado foram revistados; o depoente não foi colocado junto com as adolescentes para a revista; tem conhecimento que o acusado já foi condenado e cumpriu pena por tráfico de drogas.[...]” (grifei)

No local onde foi feita a abordagem, encontravam-se duas adolescentes, também não ouvidas em Juízo. É certo que as provas indiciárias não têm o mesmo valor probatório daquelas produzidas em Juízo. Apesar disso, em homenagem à busca da verdade real, creio ser interessante transcrever os depoimentos das adolescentes. Vejamos:

... afirma ser usuária de crack há seis meses, informando que na noite de sexta-feira, dia 10/02/2012, por volta das 22 horas, encontrava no bairro Ilha do Príncipe, e no momento em que foi abordada por policiais militares estava andando na companhia de mais três meninas do bairro, e após ter sido revistada foi encontrada escondido em seu bolso da bermuda 12 pedras de crack e 01 papelote de cocaína; que segundo esclarece que o dinheiro apreendido, oitenta reais, era de sua amiga B., e noventa reais, do seu amigo V. M. J.. Que no momento em que foi “enquadrada” pela polícia militar, tinha outras pessoas próximo à declarante, as quais foram dispensadas, ficando apreendida a declarante, que tem 14 anos de idade, e B., também tem 14 anos de idade. Que a droga apreendida pertence à declarante, sendo que B. e V. não levavam drogas consigo; que a declarante não recebeu das mãos de V. drogas e dinheiro, e não entregou dinheiro a V.; que a adolescente infratora nega o fato de ter vendido pedras de crack para a pessoa que encontra-se detida de nome V. M. J..” (declarações da adolescente J. S., fls. 16, do IP).

... na noite de sexta-feira, dia 10/02/2012, por volta das 22 horas, encontrava no bairro estava andando na companhia de mais três meninas do bairro, , e após ter sido revistada nada foi encontrado; que ao revistarem J., no bolso da bermuda dela foi encontrado 12 pedras de crack e 01 papelote de cocaína; que segundo esclarece que o dinheiro apreendido, oitenta reais, era seu, e noventa reais, do seu amigo V. M. J.. Que no momento em que foi “enquadrada” pela polícia militar, tinha outras pessoas próximo a declarante, as quais foram dispensadas, ficando apreendida a declarante, que tem 14 anos de idade, e J., que também tem 14 anos de idade. Que a droga apreendida pertence a J., sendo que a declarante e V. não levava drogas consigo; que não é verdade que J. entregou dinheiro a V..” (declarações da adolescente B. C. S., fls. 17, do IP).

A negativa de autoria do acusado V. tem apoio nas declarações prestadas pela testemunha presencial, B. C., ouvida sob o princípio do contraditório e da ampla defesa. De igual teor, são as informações prestadas pelas duas adolescentes que estavam em companhia do acusado V. no momento da abordagem.

Ditas provas me convenceram que as drogas apreendidas encontravam-se no bolso da adolescente J.. Não existe contradição quanto à isso.

A acusação está sustentada única e exclusivamente no depoimento prestado pelo policial militar J. J. O. J., única testemunha ouvida a requerimento do Ministério Público. Em Juízo, referido policial declarou o seguinte (fls. 57/58):

[...] reconhece o acusado e se recorda dos fatos; estava em patrulhamento de rotina e se dirigiram ao local narrado na denúncia que é conhecido pelo tráfico de drogas; viram grande movimentação de pessoas no local e se esconderam em um terreno baldio para observação; o depoente presenciou quando a adolescente J., uma moreninha, que estava comercializando entorpecentes, se dirigir ao acusado e pegar drogas com ele, também presenciou J. entregando o dinheiro proveniente da venda de drogas para o acusado; além de J. havia outras duas ou três jovens no beco, parecendo que exerciam a função de "olheiras" mas nada de ilícito foi encontrando com elas, que também eram adolescentes; o acusado nunca havia sido abordado pelo depoente; quando houve a transação entre J. e o acusado a policia fez a abordagem, apreendendo a droga em poder de J. e o dinheiro com o acusado; não se recorda se o dinheiro estava em notas trocadas; no momento da abordagem o acusado e a adolescente tentaram despistar dizendo que não estavam cometendo tráfico mas tal situação ficou muito clara para a polícia diante do flagrante; confirma as declarações na fase policial, constante de fls. 02 do IP. […]se recorda que no momento o depoente viu um rapaz passando, salvo engano ele era namorado de uma das adolescentes, fez a abordagem ao tal rapaz mas nada de ilícito foi encontrado em seu poder; que as diligências foram feitas após às dez horas da noite, sendo que o beco onde os fatos aconteceram tinha uma iluminação um pouco fraca; não se recorda se o acusado estava trajando alguma fantasia de carnaval, mas acredita que não, mas se lembra que era noite de carnaval e havia desfile de escolas de samba no Sambão do Povo. […] o depoente estava do outro lado do muro de um terreno baldio, o acusado e as adolescentes estavam no beco, há uma distância de menos de dois metros e viu quando o acusado entregou alguma coisa para a adolescente J. e também viu quando ela entregou o dinheiro ao acusado, mas só foram constatar que era droga, quando abordaram a J. e encontraram as pedras de crack que estavam guardadas no bolso da bermuda que ela usava; e viu quando ela guardou as drogas no bolso da bermuda; dada a curta distância que o depoente encontrava-se das pessoas envolvidas não tinha como não ter certeza do que ocorreu [...]”

É bem verdade que os depoimentos de policiais nos processos criminais são prestigiados pela doutrina e jurisprudência. No entanto, tal prova deve ser analisada à luz das demais produzidas nos autos, uma vez que a simples condição de policial não traz garantia se ser o mesmo considerado infalível em suas ações, especialmente naquelas decorrentes da sua função, exercida, quase sempre, em situação de intenso estresse.

Segundo o policial militar JOEL JOSÉ, o local onde aconteceram os fatos era um beco com iluminação um pouco fraca. Ao mesmo tempo em que disse ter presenciado J. “...se dirigir ao acusado e pegar drogas com ele, também presenciou J. entregando o dinheiro proveniente da venda de drogas para o acusado...” , disse ainda, no mesmo momento em que foi ouvido em Juízo, que “... viu quando o acusado entregou alguma coisa para a adolescente J. e também viu quando ela entregou o dinheiro ao acusado, mas só foram constatar que era droga, quando abordaram J. e encontraram as pedras de crack que estavam guardadas no bolso da bermuda...”.

Como já dito, apesar da credibilidade que deve ser dada ao depoimento de policiais, as declarações prestadas por um único policial ouvido judicialmente neste processo, não são firmes, incontroversas e indenes de dúvidas para sustentar a condenação do acusado V., pois a prova baseada neste depoimento é frágil quanto à autoria. Condenação anterior do réu não interfere nas provas de autoria e materialidade de processo posterior.

É certo que existe uma probabilidade de que os fatos ocorreram como sustentado pelo Ministério Público. Entretanto, no processo criminal tudo deve ser cabalmente provado, sem nenhuma sombra de dúvida, os fatos devem ser realmente esclarecidos, em todos os seus detalhes e circunstâncias, nada pode ser presumido.

Não ausência de certeza quanto à acusação, vigora o princípio do in dubio pro reo.

Acerca da hipótese, o renomado mestre Guilherme de Souza Nucci, na obra Código de Processo Penal Comentado, 7ª edição, pág. 672, recomenda:

Prova insuficiente para a condenação: é outra consagração do princípio da prevalência do interesse do réu – in dubio pro reo. Se o juiz não possui provas sólidas para a formação do seu convencimento, sem poder indicá-las na fundamentação da sua sentença, o melhor caminho é a absolvição.”

E assim concluo porque o Código de Processo Penal adota o sistema do livre convencimento motivado do juiz, exceto nos crimes sujeitos ao Tribunal do Júri.

Uma vez que não estou plenamente convencida que o acusado V. estava comercializando drogas ilícitas no momento em que foi abordado e preso, acolho as razões expendidas pela douta defesa porque, como já dito, a dúvida deve sempre beneficiar o réu. Vejamos:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - MATERIALIDADE COMPROVADA - AUTORIA DUVIDOSA - PROVA INSUFICIENTE - ALEGAÇÃO DE INOCÊNCIA PELO APELADO - DEPOIMENTO DE POLICIAIS - INCONCLUSIVOS - DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DA PROPRIEDADE DO ENTORPECENTE - MEROS INDÍCIOS PARA CONDENAÇÃO - INSUFICIENTE - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA - MANUTENÇÃO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO - RECURSO DESPROVIDO. 1. Em que pese a materialidade do delito restar comprovada, a autoria se mostra duvidosa, diante dos inconclusivos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela acusação e da negativa apresentada pelo apelado e pelo menor que o acompanhava. 2. Muito embora existam sérios indícios da ocorrência do delito, o mesmo não se pode afirmar no que concerne à autoria, tendo em vista que o conjunto probatório se mostra precário em se a droga ¿dispensada¿ da motocicleta pertencia exclusivamente ao apelado ou se este tinha conhecimento de que o menor que o acompanhava a portava. 3. No Processo Penal vigora o princípio segundo o qual, para alicerçar um decreto condenatório, a prova deve ser clara, positiva e indiscutível, não bastando a mera possibilidade acerca do delito e da autoria fundada em indícios. 4. Sendo a prova insuficiente para a demonstração do crime, pois não permite o contexto probatório esclarecer se o réu praticou, ou não, a atividade ilícita, deve militar em seu favor o princípio do in dubio pro reo. 5. Recurso a que se nega provimento.1

DISPOSITIVO

EM FACE DO EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL para ABSOLVER o acusado V. M. J., qualificado nos autos, na forma do art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, da imputações que lhe são feitas neste processo.

Expeça-se, imediatamente, ALVARÁ DE SOLTURA.

AUTORIZO a devolução de R$ 90,00 ao V., mediante termo. Os valores apreendidos em poder da B., se depositados à disposição deste Juízo, deverão ser transferidos ao Juízo da Vara da Infância e Juventude.

Sem custas. Após o trânsito em julgado, PROCEDAM-SE às comunicações e ARQUIVEM-SE.

P.R.I.-se.

Vitória, 15 de agosto de 2012

1 TJES, Classe: Apelação Criminal, 11110058358, Relator : SÉRGIO BIZZOTTO PESSOA DE MENDONÇA, Órgão julgador: PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Julgamento: 27/06/2012, Data da Publicação no Diário: 05/07/2012.


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Revista Consultor Jurídico, 26 de agosto de 2012, 6h47

COMENTÁRIOS DE LEITORES

5 comentários

BOA E GENERALIZADA

AVALOSBENITES (Estudante de Direito - Criminal)

Nobres colegas, discordo fraternalmente dos comentarios, o juiz não pode julgar levando em conta considerãções como citado acima e sim com provas que não gerem duvidas, que sejam fortes suficiente para questão, alias a generalização ja acontece mas de forma contraria. "A busca pela justiça não pode trilhar cominhos injustos"

COMEÇO DO FIM?

Batista Ramos (Professor)

Seria o princípio do fim dos absurdos casos de "plantações de drogas" realizados por determinados PM's? Evidente que a palavra do policial deve ser levada em consideração, mas jamais podemos permitir que ela seja elevada ao "pedestal das provas", sob pena de continuarmos a presenciar tais injustiças.

MUITO BOA A DECISÃO

mat (Outros)

Muito bem fundamentada. É evidente que os testemunhos completamente desinteressados de uma 'aviãozinho' e de um colega do réu merecem maior consideração do que aquele prestado pelo policial militar. Somente sob luz do meio dia é possível identificar o movimento de uma pessoa entregando algo a outra. Nada sustenta que as duas adolescentes foram cooptadas pelo absolvido e pela testemunha B.C.R. de forma a servirem como meio aos seus propósitos criminosos.

Comentários encerrados em 03/09/2012.
A seção de comentários de cada texto é encerrada 7 dias após a data da sua publicação.

https://www.conjur.com.br/2012-ago-26/depoimento-policial-si-nao-vale-prova-condenacao

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