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domingo, 13 de junho de 2021

Miliciano era segurança de bicheiro quando foi condecorado como herói por Flávio Bolsonaro

 Publicado 29, Feb, 2020,07:02

Macaque in the trees
Miliciano Capitão Adriano (Foto: Reprodução)
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A informação consta do depoimento de 2008 dado pelo pecuarista Rogério Mesquita, um ex-colaborador do grupo de Waldemiro Paes Garcia, o Maninho, um dos chefes do jogo do bicho e de máquinas de caça-níqueis na capital fluminense.

Mesquita afirmou à Polícia Civil que indicou Adriano, um amigo de sua família, para compor a segurança de Alcebíades Paes Garcia, irmão de Maninho, após a morte do contraventor e de seu pai, Waldomiro Garcia, o Miro, em setembro e outubro de 2004, respectivamente.

Bidi, como Alcebíades era conhecido, foi morto na última terça-feira (25), quando teve o carro atingido por cerca de 20 disparos.

Mesquita era homem de confiança de Maninho e assumiu a administração de bens da família após assassinato do amigo e a pedido do patriarca do clã, Miro, que morreu em seguida de causas naturais.


Ele não especificou a data em que indicou Adriano para compor o grupo de Bidi, que naquele momento assumiu parte dos negócios da família. Mas disse ter ficado à frente dos negócios por apenas “quatro meses”. Na época, Adriano teria participado do grupo mesmo estando preso, dando orientações para um preposto.

“Quando Bidi resolveu assumir a fazenda, o declarante lhe disse que ele deveria se precaver e contratar um corpo de seguranças que pudessem lhe trazer mais tranquilidade”, aponta o depoimento de Mesquita.


O depoimento de Mesquita levanta mais dúvidas sobre a versão do presidente Jair Bolsonaro de que, quando Adriano foi condecorado a seu pedido, o ex-PM era considerado um herói.

O ex-capitão recebeu a medalha Tiradentes de Flávio em junho de 2005 e foi defendido por Jair em discurso na Câmara em outubro do mesmo ano, após ser condenado no processo de homicídio.

“Isso [homenagem] aconteceu há 15 anos. As pessoas mudam. Para o bem ou para o mal”, disse o presidente há duas semanas.

“Condecorei o Adriano há mais de 15 anos. Como posso adivinhar o que ele faz de certo ou errado hoje?", disse o senador Flávio Bolsonaro.

Em entrevista ao jornal "O Globo", o vereador Ítalo Ciba (Avante) afirmou que Flávio visitou Adriano "mais de uma vez" quando o ex-capitão esteve preso de 2004 a 2006. Ciba também estava preso preventivamente em razão de outro homicídio. O vereador fazia parte da mesma guarnição do ex-capitão.

O ex-PM, na ocasião, estava preso acusado de matar o guardador de carros Leandro dos Santos Silva, 24, assassinado em novembro de 2003. O então policial chegou a ser condenado no Tribunal do Júri em outubro de 2005, mas conseguiu recurso para ter um novo julgamento, foi solto em 2006 e absolvido no ano seguinte.

Bolsonaro costuma dizer que Leandro, morto pelo então PM, tinha envolvimento com o tráfico, que morrera em confronto e minimiza o caso. O jovem, porém, foi morto após denunciar policiais por extorsão.

Mesquita afirmou que, mesmo preso, Adriano recebia um salário de R$ 5.000 da contravenção. Para fazer jus à remuneração, indicava colegas policiais para acompanhar Bidi enquanto estava preso. Em novembro de 2006, quando foi solto, ele passou a exercer a função fora da cadeia, acumulando também a segurança de um genro de Maninho.

Após a saída de Adriano da prisão, novos vínculos entre o ex-capitão e a família Bolsonaro se estabeleceram. O ex-PM teve dois parentes nomeados no antigo gabinete de Flávio na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).

O ex-policial também foi citado na investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro que apura se houve "rachadinha" no gabinete de Flávio quando ele era deputado estadual. Segundo a Promotoria, contas de Adriano foram usadas para transferir dinheiro a Fabrício Queiroz, então assessor de Flávio e suspeito de comandar o esquema de devolução de salários.

A ficha criminal dele também se ampliou. Ele chegou a ser preso por duas vezes acusado de tentar matar o próprio Mesquita, em maio de 2008. Foi absolvido do crime. Acabou expulso da PM em 2014 por chefiar a segurança de José Luís de Barros Lopes, o Zé Personal, genro de Maninho que, anos depois, assumiu o controle dos negócios da família.

O depoimento em que Mesquita descreve a entrada de Adriano na contravenção foi dado no curso do inquérito que investigava a tentativa de homicídio contra ele. O pecuarista acusou o ex-PM de ter tentado matá-lo, a mando de Zé Personal. Apontou ainda o ex-capitão como o responsável por outros sete homicídios, sempre a mando do genro de Maninho.

Sete meses depois, Mesquita foi assassinado em Ipanema, a duas quadras da praia, em plena luz do dia, num caso nunca solucionado.

A disputa pelo espólio de Maninho continuou cercada de acusações de ameaças e homicídios.

Zé Personal foi morto em 2011. Outro genro do contraventor, Bernardo Mello, acusou Adriano de tramar sua morte.

Em 2016, Shanna Garcia, filha de Maninho, disse à polícia que temia por sua segurança. Em outubro do ano passado, ela foi baleada em frente a um shopping na Barra da Tijuca. Ela acusou Bello de ser mandante do atentado. Ele nega.

Bidi, que afirmava estar afastado dos negócios da família, foi morto um mês depois de depor no inquérito que apura a tentativa de homicídio contra Shanna.

Adriano foi morto no início do mês numa operação policial na Bahia. Ele estava foragido desde janeiro de 2019 acusado de chefiar outra quadrilha: a milícia de Rio das Pedras, mais antiga do Rio de Janeiro. A família do ex-capitão, contudo, suspeita de uma “queima de arquivo”.

A Presidência da República afirmou que não comentaria o caso. O senador Flávio Bolsonaro não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.

O advogado de Adriano, Paulo Emílio Catta Preta, disse não ter informações sobre o envolvimento do ex-capitão com Bidi. Em depoimento à Polícia Civil em 2008, o ex-PM negou ter trabalhado como segurança tanto do irmão como do genro de Maninho. (Catia Seabra e Italo Nogueira/FolhaPressSNG)

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