Estudo sobre violência policial revela "racismo institucional" na PM de SP
Dois em cada três jovens mortos são negros; 79% dos policiais envolvidos são brancos", afirma autora da pesquisa
Publicado por Ylena Luna - 1 ano atrás
Homens negros, sobretudo jovens, são as principais vítimas da violência policial no estado de São Paulo, segundo pesquisa do Gevac (Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos) da UFSCar (Faculdade Federal de São Carlos) lançada oficialmente nesta quarta-feira (02/04). A análise sobre taxas de 100 mil habitantes indica que a mortalidade de negros é pelo menos três vezes maior que a de brancos.
Assista à entrevista da autora da pesquisa, Jacqueline Sinhoretto
Entre os anos de 2009 e 2011, 939 casos de ações policiais foram analisados. O resultado aponta que 61% das vítimas de morte por policiais eram negras. No âmbito infanto-juvenil, os dados são mais alarmantes: entre 15 e 19 anos, duas a cada três pessoas mortas pela PM são negras.
"Existe um mito que a população negra é maior e por isso os números são automaticamente maiores. Isso não é verdade: no estado de São Paulo, apenas 30% da população é negra", afirma a coordenadora da pesquisa, Jacqueline Sinhoretto.
Mais da metade das vítimas dos casos analisados, 57%, tinha menos de 24 anos quando foram mortas. “Nem as políticas de intervenção nem as de repressão estão sendo tentadas com pessoas tão jovens. A primeira intervenção da Política de Segurança Pública, nesse caso, com pessoas de 12, 14, 16 anos, já tem sido a ação violenta da polícia”, analisa Sinhoretto.
O estudo também aponta a existência de "mecanismos de produção da desigualdade racial" dentro das instituições de segurança pública. Devido à discrepância do número de mortos entre negros e brancos, o racismo institucional “está claramente desenhado”, afirma Jacqueline Sinhoretto.
Dados sobre prisões em flagrantes também foram analisados, e os resultados demonstram que também há predominância de pessoas negras presas pela polícia. Cerca de 2,5 negros são presos para cada pessoa branca.
Segundo a pesquisadora, o racismo institucional é algo presente dentro das corporações. “Existem policiais hoje que trabalham esse tema. Eles identificam e entendem de fato que a política de segurança pública provoca uma distorção nas formas de agir em relação a determinados grupos étnicos". Entretanto, afirma Sinhoretto, essas medidas ainda são muito pequenas e de pouco efeito. “Racismo institucional é uma forma de desenho da política pública que produz resultados diferentes para diferentes camadas sociais, do ponto de vista das características raciais".
Assista à segunda parte da entrevista sobre a atuação dos grupos especiais da PM-SP
O estudo destaca que o racismo não envolve os agentes policiais como indivíduos, representando uma resposta às regras tradicionais das próprias instituições responsáveis por garantir a segurança da população. “Não se trata de afirmar que o policial que prendeu uma pessoa é em si racista, e que ele fez uma opção individual por escolher aquela pessoa”, diz Jacqueline.
O "racismo" identificado no estudo é construído a partir da concepção incorporada das próprias ações públicas. Essas características são passadas de maneira informal, identificando os jovens negros como indivíduos passíveis de cometer violência. "Não é possível, entretanto, analisar se os negros cometem ou não mais crimes", analisa o estudo.
Os dados, portanto, significam apenas que há uma vigilância policial mais intensificada em relação às pessoas com esse perfil. Segundo Jacqueline, "são Jovens, negros, com certas características físicas, que foram apuradas através de entrevistas com policiais. “Eles descrevem características que estão muito associadas com a racialidade", conclui.
Essas pessoas são mais vigiadas, portanto elas são mais surpreendidas ao cometerem delitos. Apenas 1,6% dos autos investigados sobre assassinatos cometidos por policiais resultam num inquérito policial, que vai apurar as circunstâncias que essas mortes aconteceram.
A grande maioria é arquivado pela corregedoria com pressuposto de que os policiais agiram dentro da lei. “A possibilidade de que esses policiais tenham agido com excesso de força não é sequer apurada, o que indica que há uma conivência das próprias agencias que seriam responsáveis por fazer o controle policial”, afirma a pesquisadora.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que irá avaliar os dados do estudo para decidir se as políticas públicas de segurança poderão ser melhoradas. No último dia 26 de março, durante a inauguração de um parque tecnológico em Ribeirão Preto, o governador Geraldo Alckmin afirmou desconhecer qualquer tipo de atitude discriminatória nas ações efetuadas pela polícia paulista.
(*) com Haroldo Ceravolo Sereza e Dodô Calixto
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