Mesmo presos, oficiais do caso Patricia Acioli seguem na PM e já receberam R$ 218 mil em salários desde as condenações
Mesmo presos numa penitenciária federal, após serem julgados e condenados a 36 anos de reclusão por envolvimento com a morte da juíza Patricia Acioli, executada a tiros em 2011, o tenente Daniel Santos Benitez Lopez e o tenente-coronel Claudio Luiz Silva de Oliveira — apontado como o mandante do crime — continuam na Polícia Militar. Desde dezembro de 2013 e maio deste ano, respectivas datas das sentenças, a corporação já desembolsou R$ 218.334,94 em salários destinados aos dois oficiais.
O tenente Benitez ganha, segundo a página de “Consulta às remunerações” do Governo do Estado, R$ 6.751,60 mensais, que com os descontos caem para R$ 3.814,92. Na soma, seus nove vencimentos desde a condenação totalizam pouco mais de R$ 60 mil brutos. Já o tenente-coronel Claudio recebe R$ 26.295,09 brutos e R$ 5.869,47 líquidos, ainda de acordo com o mesmo site. Foram seis remunerações após o fim de seu julgamento, chegando perto dos R$ 158 mil brutos.
Enquanto isso, os nove praças condenados pela morte da juíza foram expulsos nesta terça-feira e já não têm nenhum vínculo com a PM. Assim como para o tenente Benitez e o tenente-coronel Claudio, as condenações de oito deles foram por homicídio triplamente qualificado e formação de quadrilha, porém com pena menores, variando de 19 anos e seis meses a 26 anos de prisão em regime inicial fechado. São eles: os cabos Alex Ribeiro Pereira, Carlos Adílio Maciel Santos, Jeferson de Araújo Miranda, Junior Jovanis Falcão Junior, Sammy dos Santos Quintanilha e Sergio Costa; o soldado Junior Cezar de Medeiros; e o terceiro sargento Charles de Azevedo Tavares.
O nono praça excluído é o soldado Handerson Lents Henrique, único acusado que não era do 7º BPM (São Gonçalo). Lotado no 12º BPM (Niterói) — batalhão responsável pela área onde ocorreu a execução —, ele teria indicado ao grupo criminoso a localização da casa da juíza e foi condenado a quatro anos e seis meses em regime semiaberto por violação de sigilo funcional qualificado. Para todos os envolvidos ainda cabem recursos.
Patrícia Acioli foi assassinada na porta de casa com 21 tiros, no dia 12 de agosto de 2011, no bairro de Piratininga, zona oceânica de Niterói, na Região Metropolitana do Rio. Os disparos foram efetuados por dois homens encapuzados em motocicletas, um deles depois apontado como sendo o tenente Daniel Lopez. A juíza era titular da 4º Vara Criminal de São Gonçalo e foi responsável pela prisão de cerca de 60 policiais ligados a milícias e grupos de extermínio, fato que teria gerado insatisfação entre os grupos criminosos que atuavam na região.
‘Criminoso não tem patente’
As punições distintas para oficiais e praças reabriu uma questão antiga: a diferença de tratamento entre PMs de hierarquias diferentes que cometam delitos semelhantes. Até mesmo as associações que representam as duas categorias concordam que existe uma injustiça. Para ambas, o mais indicado seria aguardar que o processo esgote todos os possíveis recursos para, independentemente do envolvido, estipular uma punição.
— Criminoso não tem patente, isso é um preconceito. O mais indicado seria anular as expulsões e só fazê-lo quando e se os oficiais também forem excluídos — diz Vanderlei Ribeiro, presidente da Associação de Praças da PM e do Corpo de Bombeiros do Rio, acrescentando: — Os praças são vítimas de uma estrutura falida, são penalizados porque praticaram um ato comandado. Para piorar, a corregedoria interna protege quem está em cima e arrebenta quem está embaixo.
— Podemos entender que houve dois pesos e duas medidas. Se cabe recurso, é porque há chance de provar ou não a inocência. Precisa ser um processo isonômico — afirma o coronel Fernando Belo, da Associação de Oficiais Militares Estaduais (AME/RJ): — Não pode haver o “nós” e o “eles”. Tem que ser apenas o “nós, policiais militares”. Mesmo porque a lei é igual para todos.
As punições administrativas diferentes encontram explicação na lei. Enquanto PMs de patentes mais baixas podem ser demitidos por decisão do comandante-geral, após processo em que expõem sua defesa, oficiais têm exclusão submetida primeiro ao secretário de Segurança, que remete o caso ao Tribunal de Justiça (veja mais no infográfico abaixo). Para o coronel José Vicente, ex-secretário nacional de Justiça, alterações jurídicas nesse cenário seriam bem-vindas:
— Temos um bandido recebendo como policial de alto nível, isso é um deboche. A questão depende da legislação federal, mas deveria haver uma mudança. No caso de condenação, como com qualquer funcionário público, deveria perder a patente indepedenetemente do processo administrativo.
A Secretaria estadual de Segurança informou que a expulsão dos dois oficiais se confirmará quando o Tribunal de Justiça enviar a conclusão do processo com o pedido de perda do cargo público. A pasta frisou, ainda, que para tal é preciso aguardar a decisão de última instância, após esgotarem-se todos os possíveis recursos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário