QUI, 01/10/2015 - 07:44
ATUALIZADO EM 01/10/2015 - 08:03
Do blog do Marcelo Auler
Marcelo Auler
Os delegados responsáveis pela Operação Lava Jato bem que tentaram atingir aqueles que hoje são os principais críticos do trabalho que realizam: o Agente da Polícia Federal (APF) Dalmey Fernando Werlang, que assumiu a instalação de um grampo ambiental, sem autorização judicial, na cela do doleiro Alberto Youssef; e o Delegado de Polícia Federal (DPF) Mario Henrique Castanheira Fanton, que foi à Curitiba convocado por esses mesmos delegados, mas saiu de lá, direto para Brasília, com relatórios detalhados de possíveis irregularidades que na atuação de seus colegas.
Em agosto passado, os principais delegados da cúpula da Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR) – Rosalvo Ferreira Franco (superintendente), Igor Romário de Paula (diretor da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado – DRCOR), Maurício Moscardi Grillo (chefe do Grupo de Investigações Sensíveis – GISE), Daniele Gossenheimer Rodrigues (chefe do Núcleo de Inteligência Policial – NIP), Érika Mialik Marena (chefe da Delegacia de Combate ao Crime Financeiro – Delefin) e e Márcio Adriano Anselmo (da Delegacia de Combate ao Crime Fazendário – Delefaz) – representaram ao Ministério Público Federal (MPF) dizendo-se caluniados pelos dois colegas, com as inverdades que fizeram constar das investigações.
De forma ágil, o procurador da República, Daniel Coimbra, em pleno feriado jurídico do 11 de agosto, Dia do Advogado, apresentou à Justiça Federal, pela distribuição eletrônica, a denúncia contra Werlang e Fanton. Classificando-os de “dissidentes”, os acusou por caluniarem seus colegas. Foi em uma terça-feira, e o processo, teoricamente, foi mantido em segredo. Nem a assessoria de imprensa da Procuradoria soube dele. Mas, no final de semana seguinte, o jornal O Estado de S. Paulo e o seu blog, noticiavam com destaque o fato, publicando fotos da primeira página da peça acusatória.
A iniciativa do procurador foi vista pelo deputado Aluísio Mendes Guimarães (PSDC-MA) como uma forma de intimidar Fanton, que estava convocado para depor na CPI da Petrobrás, por proposta do próprio Mendes. A ser verdadeira esta tese, o tiro saiu pela culatra. Na terça-feira (29/09) à tarde, ao sentar-se no plenário da Comissão, o delegado já tinha motivos para não temer o judiciário paranaense.
Na véspera (28/09), o juiz da 12ª Vara Federal de Curitiba, Danilo Pereira Júnior, não apenas rejeitou a denúncia, como em uma crítica velada ao MPF, apontou erro na capitulação do tipo penal.
Pereira Júnior entendeu que os policiai , em tese, agiram como deveriam, informando aos superiores aquilo que supõem crime. Somente no caso de as suas informações não se confirmarem é que terão incorrido em ato criminoso. Mas não será a Calúnia, prevista no art. 138 do Código Penal (com pena de detenção de seis meses a dois anos) e sim a Denunciação Caluniosa – art. 339 do CP, com possibilidade de prisão de dois a oito anos.
Para o juiz, ao contrário do que entendeu o MPF, Werlang e Fanton só devem responder judicialmente se ficar confirmada que eles estão denunciando inverdades, propositadamente. Neste caso, podem ser processados por “dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente“.
Werlang é o agente especializado em monitoramentos telefônicos que assumiu ter colocado o grampo, sem autorização judicial, na cela de Alberto Youssef, em março de 2014. Ele diz ter recebido a ordem de três delegados: o superintendente Rosalvo, o diretor da DRCOR, Igor de Paula, e o delegado da Fazendária, Marcio Adriano, que teoricamente coordena a Lava Jato dentro do DPF.
Sua confissão contraria a versão oficial da SR/DPF/PR para o grampo que o doleiro Youssef encontrou, em abril de 2014, na cela que ocupava. Através de uma sindicância que tem sido muito criticada, a Polícia Federal no Paraná concluiu que o aparelho localizado pelo doleiro foi colocado, em 2008, para monitorar o traficante Fernandinho Beira-Mar. Werlang garante que eram diferentes: o de Beira-Mar, ele mesmo montou; o encontrado em 2014 era industrial de propriedade do DPF. Por conta disso, caiu em desgraça junto à Força Tarefa da Lava Jato, foi afastado do NIP, onde estava lotado desde 2004 e o transferiram para o interior do Estado.
Fanton, lotado em Bauru (SP), foi chamado à Curitiba pelos delegados Igor de Paula e Moscardi, com que trabalhou em Rio Branco (AC).
Desejavam incriminar o delegado Paulo Renato de Souza Herrera e o ex-agente Rodrigo Gnazzo, acusando-os de prepararem dossiês para desestabilizar a Operação Lava Jato, como consta da Portaria que instaurou o Inquérito 737/15 (veja ao lado).
Sem vestígios dos “dossiês” – Herrera foi um dos primeiros a apontar, internamente, possíveis irregularidades – como o grampo sem autorização judicial – na Operação Lava Jato. Gnazzo, sequer continua no DPF, mas é amigo de Herrera. A Fanton coube presidir o inquérito, aberto para investigar a elaboração de dossiês que em tese seriam negociados com as defesas dos acusados na Lava Jato.
Durante sua estada de pouco mais de 30 dias no Paraná, ele se aproximou de Werlang e, à medida que foi se inteirando dos fatos, discordou das versões que lhes foram apresentadas pelos DPFs que o convocaram. Por pensar diferente e se recusar a cumprir suas determinações, foi alijado por eles.
Em maio, deixou a capital paranaense sem encontrar vestígios dos dossiês, mas convencido de que a investigação sobre o grampo na cela de Youssef deveria ser refeita. Levantou, ainda, suspeitas das sindicâncias, presididas por Moscardi, em torno dos vazamentos de notícias sigilosas. Para ele, Igor de Paula e sua mulher, a delegada Daniele, eram os principais responsáveis pela divulgação de informações sigilosas, como escreveu em um despacho.
Apenas ao saber do fim de sua missão em Curitiba, foi que tomou a termo o depoimento de Werlang, isto em 4 de maio, ultimo dia oficialmente da sua missão na capital paranaense.
Nesta oportunidade, o APF, pela primeira vez, confirmou ter posto o grampo na cela; assumiu a instalação de outra escuta no fumódromo da SR/DPF/PR, desta feita, por ordem da delegada Daniele; e revelou que, após a descoberta do gravador por Youssef, foi orientado por Igor de Paula a apagar todos os vestígios das conversas gravadas. Tal como noticiamos no Blog, em 20 de agosto, na reportagem “Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR”.
No mesmo dia 4, Fanton preparou seu despacho final no inquérito 737/15, que foi publicado, na íntegra, pela primeira vez, no site Tijolaço, de Fernando Brito. Nele, o delegado de Bauru relata suas desconfianças com o comportamento dos delegados da Força Tarefa da Lava Jato. Nesta ocasião, como também noticiamos em “O Grampo da Discórdia”, aqui e na revista CartaCapitalque está nas bancas, Fanton recomendou:
“Diante de alguns fatos por esse missivista presenciados (…) requeiro a suspensão de todas as medidas pleiteadas, segundo exposto: O requerente não vê confiança nas premissas probatórias que lhe foram apresentadas, merecendo revisão minuciosa e cautelosa, com interferência direta do Ministério Público Federal, sob pena de se cometer graves e irreversíveis injustiças”.
Àquela altura, o que ninguém sabia até ele revelar na terça-feira (29/09) na sessão secreta da CPI da Petrobrás, é que já estava em linha direta com a Diretoria de Inteligência Policial (DIP) de Brasília. Foi de lá que recebeu a recomendação de não levar o depoimento do técnico em monitoramentos para a superintendência do Paraná. Mandaram-lhe a passagem aérea para ir direto à capital federal, onde entregou o depoimento, seu despacho e foi ouvido pela Corregedoria de Assuntos Internos (Coain) da DIP.
Liminar negada pelo STF – Werlang por sua vez, reuniu as informações que tinha e denunciou as pressões que diz terem sido feitas pelos delegados da Lava Jato contra Fanton. Mas, não só estas. Pelo que afirmou, também o chefe da carceragem, agente Paulo Romildo Rosa Filho, o “Bolacha”, foi induzido a sustentar, na sindicância interna da superintendência, que o grampo achado por Youssef era o mesmo usado em 2008 na cela de Fernandinho Beira-Mar. Por e-mail, ele repassou tudo ao procurador da República Januário Paludo, com quem trabalhara nas investigações do Caso Banestado. Paludo repassou as informações ao seu colega Coimbra, que atua no Controle Externo da Polícia Federal. As informações, porém, também chegaram ao conhecimento dos demais delegados.
Foi respaldados no e-mail de Werlang, no despacho e no depoimento de Fanton, no dia 6 de maio, em Brasília, que os delegados da Lava Jato enviaram ao Ministério Público Federal (MPF) representação contra o agente e o delegado pelo suposto crime de calúnia.
A representação é vista por muitos como tentativa de constranger Werlang e, principalmente, Fanton – que ainda não tinha deposto na CPI. Mas, na seção de terça-feira, garantido pelo sigilo, segundo um parlamentar, ele contou detalhes do que apurou, inclusive repassou uma lista de possíveis “alvos” que o DPF Igor Romário pretendia investigar. A relação é grande, basicamente de delegados e policiais, inclusive de São Paulo e Mato Grosso do Sul. Inclui ainda o atual secretário de segurança do Paraná, o delegado federal Wagner Mesquita, e seu antecessor, o também delegado federal Fernando Francischini (SD-PR)..
Os delegados da Lava Jato, entendem que estas críticas – que garantem ser infundadas = poderão levar ao descrédito de toda a Operação que desvenda o maior esquema de corrupção entre políticos, empresários e diretores de empresas estatais.
Para a sessão da CPI desta quinta-feira (01/10), estão convocados o superintendente Rosalvo, o seu segundo homem, José Washington Luiz Santos, diretor regional Executivo, e o delegado Moscardi. Eles recorreram ao ministro do Supremo, Teori Zavascki, em busca de uma liminar que os liberasse de comparecer. Mas não tiveram êxito. O ministro apenas autorizou serem assistidos por advogados. Mas, a presença deles na Comissão é na função de testemunhas, pois oficialmente não sofreram nenhuma acusação, além das críticas de Werlang, Fanton, Herrera, e outros policiais federais.
“E mais nada!” - Se a representação dos delegados pelo suposto crime de calúnia praticado por Fanton e Werlang já soou estranha, o comportamento do Ministério Público Federal, ágil em apresentar uma denúncia na qual chamou os denunciados de “dissidentes”, surpreendeu a muitos, e permite interpretações variadas, como a de um delegado aposentado ouvido pelo Blog na reportagem “Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR”:
“A denúncia do MPF contra os policiais federais “dissidentes” parece ser mais uma evidência do “racha” institucional nos trabalhos da Lava Jato, o que levou a Procuradoria da República a assumir previamente um lado a que deve proteger. Acho isso até natural considerando que pode estar em jogo a ilicitude da investigação como um todo, tese que interessa apenas aos empresários investigados”.
Para o deputado Aluísio Mendes Guimarães Filho (PSDC-MA), que antes de ser parlamentar foi agente da Polícia Federal, a denúncia tinha, sim, um tom de intimidação, conforme ele expôs na época em que divulgada:
“Isso é absurdo. Estão tentando intimidar o Fanton porque ele vai depor na CPI. É uma tentativa de intimidação. Ele, dentro do inquérito, onde ele era presidente, relata uma série de situações estranhas e relata ao superior dele para que tome providências , inclusive que comunique ao Ministério Público, que comunique à Justiça Federal. Ele faz o trabalho que deveria ser feito”.
Coincidentemente, ao entrar para depor na CPI na tarde de terça-feira, Fanton soube da decisão do juiz Pereira Filho recusando a acusação que o MPF lhe fizera.
No despacho que rejeitou a denúncia, outras falhas, além da inadequação na capitulação do crime, foram apontadas pelo próprio juiz como, por exemplo, os parcos documentos apresentados como provas e a duvidosa idoneidade deles:
“Acompanham a peça acusatória os seguintes documentos:
- a) documento apócrifo, dirigido ao Procurador da República Januário Paludo e com autoria indicada do denunciado Dalmey Fernando Werlang. No documento, o denunciado descreve fatos e solicita ao Procurador orientações de como proceder (doc. INF3);
- b) captura do que parece ser a tela de um celular, com a indicação de mensagem que teria sido enviada pelo denunciado Mario Renato Castanheira Fanton a pessoa desconhecida, na qual afirma estar em Brasília para relatar fatos aos “Diretores” (doc. INF4);
- c) documento subscrito pelos Delegados de Polícia Federal Rosalvo Ferreira Franco, Igor Romário de Paula, Márcio Adriano Anselmo, Erika Mialik Marena, Daniele Gossenheimer Rodrigues e Maurício Moscardi Grillo, representando ao Ministério Público Federal pela tomada das providências cabíveis à vista da acusação de coação (doc. NOT_CRIME5).
E mais nada”.
Ao analisar estas “provas”, o juiz entendeu-as como narrativas de possíveis crimes que Dalmey e Fanton expuseram aos seus superiores, tal como dever de ofício dos policiais. Na sua decisão, Pereira Júnior classificou de fracas as provas do crime de calúnia: o suposto e-mail de Dalmey e a tela do celular de Fanton, justamente por serem informes de fatos criminosos:
“A primeira, frise-se, representa – em tese, porque sem assinatura e sem indicação do meio utilizado para encaminhamento – a narração, dirigida a Procurador do Ministério Público Federal em busca de orientação, de fatos entendidos pelo réu Dalmey como crime. A segunda, por sua vez, representa o que seria uma mensagem enviada via celular a destinatário desconhecido, na qual o réu Mário também narra atos em seu entender criminosos e que é finalizada com a notícia de que ele estaria em Brasília para relatar tais fatos aos “Diretores”.
Mais adiante, de forma clara, o magistrado entra na questão do equívoco na capitulação do crime:
“A bem da argumentação, por fim, registre-se que ambos os documentos trazidos ao processo indicam que, se é que os réus de fato agiram, o que fizeram foi levar ao conhecimento da autoridade – Procurador da República e Diretores da Polícia Federal – fatos considerados por eles como caracterizadores de crime”.
Recorrendo a um acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar a Apelação nº 191/DF, relatada pelo ministro José Arnaldo da Fonseca, (DJ de 29/04/2002, p. 151), o magistrado da 12ª Vara Federal expôs inexistir crime contra a honra quando do relato de possíveis ações criminosas a serem apuradas. Pode haver, sim, a denunciação caluniosa, caso os supostos “crimes relatados” não sejam confirmados:
“Ao noticiar fato criminoso, desde que as expressões se contenham nos limites da narrativa, não comete o noticiante ou requerente infração penal contra a honra. Se, a posteriori, verificar-se falsa a imputação, o crime, em tese, será o de denunciação caluniosa”, diz o acórdão citado.
Prova oral não é totalmente isenta - Para caracterizar a “denunciação caluniosa”, porém, seria preciso investigar a suposta ação criminosa para, então, concluir se ‘a notícia crime” é falsa. Ainda assim, é preciso provar que o denunciante a sabia falsa. Daí o motivo de se poder considerar precipitada a iniciativa do procurador Coimbra ao acusar os dois policiais “dissidentes” (lembre-se) sem ter em mãos as conclusões oficiais do que ainda está sendo apurado. Há quem justifique tal atitude, como o delegado aposentado que falou ao Blog, como uma defesa da Operação Lava Jato, evitando que ela caia em descrédito. Mas também há quem entenda como uma intimidação aos “dissidentes”, um dos quais chamados pelos próprios delegados da Lava Jato para fazer uma investigação, interrompida antes de ser concluída.
O juiz recorre outro acórdão do STJ para mostrar que a denuncia do Ministério Público precisa apresentar o histórico dos fatos de forma a poder ser acolhida.
“A denúncia – enquanto instrumento formalmente consubstanciador da acusação penal – constitui peça processual de indiscutível relevo jurídico. ela, ao delimitar o âmbito temático da imputação penal, define a própria res in judicio deducta. A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso, em toda sua essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta, impõe-se ao acusador como exigência derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o exercício, em plenitude, do direito de defesa. Denúncia que não descreve adequadamente o fato criminoso é denúncia inepta“. (STF, HC 70.763, DJ 23-9-94).
Pereira Junior afasta a possibilidade de que os testemunhos prometidos pelo MPF possam suprir as falhas que ele encontrou na denúncia. Aliás, só faltou dizer, como muitos operadores do Direito o fazem, que as testemunhas “são as prostitutas das provas”, Chegou perto:
“E nem socorre ao Ministério Público Federal a expectativa da prova por meio oral, já que, para tanto, seria necessário superar a precedente ausência de informações e indícios de materialidade – o que, pelas peculiaridades do caso, tal como expostas pelo parquet, não parece possível. Sem mencionar, por óbvio, que toda e qualquer prova oral não é completamente isenta de interesse de resultado no processo, e isso parece ainda mais verdadeiro em se tratando da prova dos crimes contra a honra.
Destarte, forçoso reconhecer a ausência de justa causa para o exercício da ação penal, que no processo penal brasileiro, é exigida pelo artigo 395 do Código de Processo Penal e reflete a preocupação do legislador de que – à vista das repercussões de ordem social, patrimonial e pessoal da persecução criminal na vida do acusado, além dos custos inerentes à movimentação da máquina judiciária – sejam rigorosamente observadas as condições da ação e os requisitos legais elencados no artigo 41 do CPP.”
Outro estranho erro do MPF - Há outro fato que aparentemente passaria despercebido, como mero engano do MPF, mas que pode guardar ligações com o que foi relatado no início da seção da tarde desta terça-feira (29/09) da CPI da Petrobrás. Em agosto, quando a denúncia poe calúnia, contra Werlang e Fanton, foi apresentada à Justiça, sua íntegra foi mantida em segredo pela Procuradoria da República, em um fato pouco usual para um caso de calúnia, ou mesmo se fosse tratado como denunciação caluniosa. Afinal, como determina a Constituição, a regra é os processos serem públicos. O sigilo é exceção.
Mas, na Lava Jato, os sigilos têm sido relativos. Há vazamentos selecionados que, como se viu acima, no seu despacho o delegado Fanton credita, principalmente, ao casal de delegados Igor de Paula e Daniele.
Também no caso desta denúncia por calúnia, o vazamento ocorreu e a ação proposta pelo procurador Coimbra, foi publicada dias depois de ter sido protocolada na Justiça Federal do Paraná no Blog do Estadão. Nele, foi revelada a foto da folha de rosto do documento que era dirigido à 14ª Vara Federal. O processo nunca chegou lá e acabou distribuído por sorteio à 12ª Vara Federal. Diante do questionamento do juiz Pereira Júnior se existiria alguma prevenção pelo outro juízo, o MPF manifestou-se alegando que “a referência à 14ª Vara Federal no cabeçalho da denúncia decorre de erro material. Não há, em princípio, prevenção da 14ª VF, pelo que a peça deveria ter sido encaminhada à livre distribuição, sem a equivocada referência que nela constou“.
Como foi revelado na tarde de terça-feira (29/09) na CPI, na 14ª Vara tramita, em sigilo, o inquérito policial que Fanton instaurou para investigar os supostos dossiês, mas que acaba narrando também a questão dos grampos instalados sem autorização judicial na Superintendência do DPF no Paraná. Como já se noticiou, a investigação sobre o grampo na cela de Youssef limitou-se a uma sindicância que concluiu ser ele antigo, encerrando a questão.
Quando da distribuição do Inquérito 737/15, instaurado por Fanton, o MPF remeteu-o ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, que apura os casos de corrupção ocorridos na Petrobrás. Moro considerou-se incompetente e mandou os autos à livre distribuição. Ele não viu ligações entre a sua apuração da corrupção na Petrobrás com a questão do grampo em si e dos supostos dossiês. Assim, o caso foi para a 14ª Vara.
Deputados vão ao STF queixar-se do juiz - A CPI, por requerimento do deputado Aluísio Mendes Filho, solicitou cópia integral do que vem sendo apurado. O pedido, porém, foi rejeitado pelo juiz Josegrei da Silva, da 14ª Vara, com a estranha justificativa de que aquela investigação não tem relação com o trabalho da Comissão Parlamentar, por não se referir à Operação Lava Jato em si.
Como lembrou o deputado Aluísio Mendes, a portaria que instituiu esta apuração descreve-a como sendo uma investigação da “violação de sigilo funcional e associação criminosa, denunciação caluniosa, corrupção ativa, violação de sigilo funcional praticado pelo delegado de Polícia Federal Paulo Renato de Souza Herrera e o agente da Polícia Federal Rodrigo Gnazzo, os quais teriam confeccionado um dossiê com dados funcionais sigilosos e inverídicos sobre a investigação criminal denominada Operação Lava Jato”.
Pode não estar relacionado às falcatruas dentro da Petrobrás, como entendeu o juiz Moro, mas tem ligação com a apuração das mesmas. Ou seja, no entendimento dos deputados, o âmbito de investigação da CPI vai além da corrupção na Petrobras, objeto da Operação Lava Jato, sob os cuidados do juiz Moro, alcançando todos os fatos que circundaram a investigação do, até hoje, maior escândalo de corrupção no país.
CPI da Petrobras vai a Teori Zavascji em busca do IPL 737/15 – Foto: Antônio Araújo / Câmara dos Deputados
Para os deputados, ficou caracterizado que querem manter essa investigação longe dos holofotes. A CPI irá recorrer ao ministro Teori Zavascki em busca de uma solução. Mas, diante desta recusa do juiz da 14ª Vara, aquele erro material na capa da denuncia contra o delegado Fanton e o agente Dalmey, reconhecido pelo MPF, pode, sim, despertar em muitos a suspeita de que havia um desejo embutido de conseguir que os dois casos – o Inquérito 737/15 e a denúncia por calúnia – tramitassem com um mesmo juiz, pelas ligações intrínsecas que têm. Não foi, porém, o que aconteceu e, a depender da Justiça do Paraná, o processo por calúnia morreu antes de nascer.
A hora é de cautela e equilíbrio -Vem a calhar, a análise feita pelo mesmo delegado federal aposentado, ouvido pelo Blog na reportagem “Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR”:
“Com a referida decisão (do juiz Pereira Filho), restou evidente que houve, no mínimo, certo açodamento por parte do Procurador da República ao oferecer denúncia contra policiais federais no calor das investigações, que ainda dependem de esclarecimentos relevantes.Por outro lado, a manifestação judicial do Paraná e a recente deliberação do Supremo Tribunal Federal de desmembramento e redistribuição de um dos processos, denotam que na visão das autoridades judiciais competentes não é unânime o acerto de determinadas ações levadas a efeito pela Força Tarefa da Lava Jato.Daí, eu entendo que se houver adequada dose de humildade e pleno acatamento das orientações superiores pelos integrantes da grandiosa e histórica Operação Lava Jato, passando a agir com mais cautela e equilíbrio, estaremos mais próximos de atingir os verdadeiros ideais de Justiça que espera a sociedade brasileira”.Ouça-se a voz da experiência!.
A decisão do juiz Danilo Pereira Júnior pode ser encontrada da seguinte forma: www.jfpr.jus.br
Processo nº 5040132-89.2015.4.04.7000
28/09/2015 15:06 – 9. Despacho/Decisão – Denúncia/Queixa Rejeitada – DESPADEC1
Ou pelo link:
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