Dados obtidos com exclusividade pelo g1 apontam que não houve mudança entre fevereiro e junho nos 10.125 equipamentos disponíveis para policiamento nas ruas. Durante a campanha, Tarcísio atacou as câmeras e prometeu retirá-las, mas recuou e agora estuda ampliar o programa.
Por Arthur Stabile, g1 SP — São Paulo
21/06/2023 04h00
Atualizado há 2 meses
Policiais militares começaram a usar neste sábado (1º) câmera corporal nos coletes dos uniformes na capital de São Paulo — Foto: Divulgação/PM SP
Dados obtidos com exclusividade pelo g1, por meio da Lei de
Acesso à Informação (LAI), indicam que havia 10.125 equipamentos com os
policiais em 2 de fevereiro de 2023. O número segue igual em resposta enviada
no dia 6 de junho pela PM, vinculada à Secretaria da Segurança Pública (SSP-SP)
do secretário Guilherme Derrite. São Paulo tem cerca de 100 mil policiais.
A gestão Tarcísio confirmou, por meio de nota enviada pela
SSP, que não adquiriu novas câmeras, mas que tem a intenção de ampliar o
programa.
"A ampliação das funcionalidades das câmeras corporais
e a implementação dos equipamentos em todos os batalhões de policiamento do
estado são compromissos da atual gestão. Atualmente, cerca de 48% dos batalhões
já contam com o dispositivo, totalizando 10.125 câmeras corporais em uso pelas
forças policiais em todos os turnos de serviço".
"Estudos estão em andamento para a expansão do programa
para outras regiões do Estado, incluindo a análise da infraestrutura de rede
móvel, bem como a avaliação de novas funcionalidades, como a identificação de
placas de veículos roubados ou furtados, entre outras. Do total de câmeras em
utilização, sete mil foram adquiridas no ano passado, e as restantes foram
adquiridas em 2021."
Tabela abaixo mostra que os antecessores de Tarcísio, Rodrigo Garcia e João Doria, ambos do PSDB, adquiriram novas câmeras ao longo dos últimos anos. O uso do equipamento nos uniformes da PM em SP evitou 104 mortes, segundo levantamento da FGV em dezembro de 2022 e a letalidade dos policiais em serviço foi a menor da história no ano passado.
Câmeras nos uniformes da PM em SP
22/jul/2020: 30
1/ago/2020: 585
20/mai/2021: 3.000
17/mar/2022: 5.600
5/dez/2022: 10.000
2/fev/2023: 10.125
6/jun/2023: 10.125
O Olho Vivo foi implantado em agosto de 2020 e começou com
585 câmeras acopladas aos coletes usados pelos policiais militares. Em dezembro
de 2022, no término do mandato de Doria e Garcia, a corporação contava com 10
mil equipamentos à disposição. Antes, testes foram feitos com policiais usando
30 unidades.
SP teve o menor nº de mortes por PMs em serviço na história
em 2022 após câmeras
De acordo com a Polícia Militar, 64 batalhões ganharam
câmeras em cinco datas diferentes de ampliação do programa: em junho e novembro
de 2021, além de janeiro, abril e julho de 2022. A última expansão ocorreu no
dia 26 de julho do ano passado.
Para José Vicente da Silva Filho, ex-secretário nacional de
segurança pública no governo Fernando Henrique Cardoso, não é necessário que
todos os policiais militares possuam câmeras em seus uniformes. Contudo, vê o
item como "bastante útil" em vários aspectos.
"Há uma queda substancial de agressões. [As câme
Entenda como funcionam as câmeras corporais usadas pela PM
de São Paulo
"Há uma queda substancial de agressões. [As câmeras]
Fornecem subsídios de evidência para a Justiça decretar a prisão de suspeitos e
mostram correção em casos de policiais que exageraram no uso da força, o que
tem levado o emprego das câmeras ao aperfeiçoamento da conduta dos
policiais", diz o especialista.
Silva Filho afirmou ter estranhado o fato de a Polícia Civil
ainda não ter aderido ao programa "pelo menos nas [equipes] de
policiamento mais ostensivo, unidades como o Garra, COE e divisão de operações
estratégicas. Todo tipo de ação mais ostensiva precisaria estender [o uso de
câmeras] não há justificativa", diz o especialista, que não vê má vontade
com o projeto por parte do governo paulista.
"Não acredito que governador queira levar a ferro e
fogo o que ele falava como candidato. O candidato fala uma coisa que depois não
são feitas quando assume a cadeira do Executivo. Não há movimento de
retirá-las", diz, sobre as críticas feitas por Tarcísio, no ano passado,
contra o uso de câmeras nos uniformes da PM (leia abaixo).
Governador e secretário já pensaram em tirar as câmeras
Tarcísio bate continência para oficial da PM — Foto: Fernando Nascimento/Governo SP
Durante o período da campanha eleitoral, o então candidato
Tarcísio de Freitas atacou as câmeras em uniformes de PMs, considerando o
programa como "um voto de desconfiança para o policial" e prometeu
retirá-las.
"Na minha opinião, não [deve usar câmera]. Na minha opinião,
é incompatível com o tipo de atuação, com a natureza de atuação que ela [PM]
tem. E quem disse que ela não vai seguir a lei não estando com a câmera",
disse Tarcísio, em agosto do ano passado.
Antes, ele havia criticado o fato de que há "350 mil condenados
perambulando pelo estado de São Paulo, sem nenhum tipo de monitoramento".
"Em vez de monitorar o bandido, eu preferi monitorar o policial?",
afirmou, em junho de 2022.
Câmeras corporais de PMs registram conversa com homem que
roubou arma e atirou em policiais: 'Não vou correr'
PM libera à Justiça de SP imagens das câmeras corporais de
agentes que amarraram mãos e pés de homem durante abordagem
A posição de Tarcísio mudou. Em outubro, durante a campanha
para o 2º turno contra Fernando Haddad (PT), afirmou que iria chamar as forças
de segurança para avaliar as câmeras "do ponto de vista técnico a
efetividade ou não, e aperfeiçoamento da política pública".
"É uma questão que eu considero que hoje que inibe o
policial. Acho que ela tem atrapalhado a produtividade. Mas isso é uma
percepção", disse. "Não existe nenhuma política pública que não possa
ser reavaliada, que não possa sofrer melhorias".
Como funcionam as câmeras corporais da Polícia Militar de
São Paulo — Foto: Arte/g1
Secretário definiu câmeras como 'forma de intimidação'
O atual secretário da Segurança, Guilherme Derrite, foi
outro político a criticar a implementação das câmeras nos uniformes. Ex-PM da
Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), ele declarou em abril de 2021,
quando era deputado federal, que o programa mostrava que o governo de SP
tratava seus policiais "sempre com desconfiança e desmotivação".
Em novembro de 2021, comentou ação dentro de um shopping e disse que "os policiais que entraram no shopping arriscando suas vidas são os mesmos que têm câmeras nas fardas como forma de intimidação para que atirem cada vez menos para se defender".
O secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo,
Guilherme Muraro Derrite, esteve, na manhã desta terça-feira (24), na cerimônia
de comemoração do 18° aniversário de instalação do 8º Comando de Policiamento
do Interior (CPI-8), em Presidente Prudente (SP) — Foto: Betto Lopes/TV
Fronteira
O discurso mudou quando Tarcísio oficializou Derrite como
escolhido para comandar a Secretaria da Segurança. À TV Globo em janeiro deste
ano, ele garantiu que o governo não iria acabar com o programa, mas ampliar sua
funcionalidade.
"O programa vai ser mantido e a Polícia Militar vai
apresentar um planejamento estratégico para um novo convênio para expansão
dessas câmeras. Isso está sendo estudado pela Polícia Militar, também os custos
das câmeras são consideráveis", afirmou Derrite naquele mês.
Letalidade de PMs em serviço foi menor da história
A quantidade de pessoas mortas por policiais militares em
serviço, as chamadas Mortes Decorrentes de Intervenção Policial (MDIP), foi a
menor da história em 2022 com a ampliação do Programa Olho Vivo. O total caiu
de 423 mortes em 2021 para 256 em 2022.
O dado faz parte de um levantamento feito pelo Fórum
Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com a Unicef divulgado em
maio.
Pesquisadora moradora de favela em SP diz que câmeras nas
fardas dos PMs levaram 'sensação de sossego' à comunidade
A redução de letalidade de adolescentes foi de 80,1%, com
queda de 171 casos em 2017 para 34 em 2022.
Os pesquisadores destacam que, embora a letalidade provocada
por policiais militares passe a cair a partir de 2018 entre crianças e
adolescentes, a queda se acentua a partir de 2020, ano de implementação das
câmeras operacionais portáteis.
PMs de 18 batalhões que passaram a usar câmeras em uniformes
registram letalidade zero
Nos batalhões que incorporaram o uso das câmeras corporais
tiveram redução de 76,2% na letalidade dos policiais militares em serviço entre
2019 e 2022, enquanto nos demais batalhões a queda foi de 33,3%. O número de
adolescentes mortos em intervenções de policiais militares em serviço caiu
66,7%, passando de 102 vítimas em 2019 para 34 em 2022.
"Com a implementação das câmeras corporais e outras
medidas de controle, os adolescentes deixaram de ser o principal grupo vitimado
pela PM", destacou Samira Bueno, diretora do FBSP.
Leia o posicionamento da SSP na íntegra:
"A ampliação das funcionalidades das câmeras corporais
e a implementação dos equipamentos em todos os batalhões de policiamento do
Estado são compromissos da atual gestão. Atualmente, cerca de 48% dos batalhões
já contam com o dispositivo, totalizando 10.125 câmeras corporais em uso pelas
forças policiais em todos os turnos de serviço. Instaladas no uniforme dos
policiais, as bodycams contam com um sistema ininterrupto de gravação e
transmissão das imagens em tempo real, facilitando a tomada de decisão e dando
mais transparência e legitimidade às ações dos agentes.
Estudos estão em andamento para a expansão do programa para
outras regiões do Estado, incluindo a análise da infraestrutura de rede móvel,
bem como a avaliação de novas funcionalidades, como a identificação de placas
de veículos roubados ou furtados, entre outras. Do total de câmeras em
utilização, sete mil foram adquiridas no ano passado, e as restantes foram
adquiridas em 2021."