12/12/20 por Ponte Jornalismo
Vítimas da Polícia Militar na Vila Madalena (zona oeste) e São Mateus (zona leste) motivam artistas e ativistas a levaram grafites para ressignificar espaços marcados por violência em SP
As ruas estreitas e vielas em que aconteceram manifestações e repressões policiais nas últimas semanas ganharam cores neste sábado (12/12). Artistas se organizaram com ativistas de direitos humanos e foram à comunidade onde Wenny Sabino Costa Martin, de 18 anos, vivia e foi morto pela Polícia Militar, no Jardim Vera Cruz, região de São Mateus, zona leste de São Paulo, para grafitar as paredes e “democratizar a arte na comunidade”, conforme define o artista Vinícius Batista, o Caps, de 33 anos.
Além da morte de Wenny, o ato que começou na manhã deste sábado e deve se estender pelos próximos dias, levando o grafite para comunidade, aconteceu em memória ao artista plástico Wellington Copido Benfati, conhecido como NegoVila, morto pelo sargento da Polícia Militar Ernest Decco Granaro, de 34 anos. Decco estava de folga quando matou NegoVila, após uma discussão em um bar na Vila Madalena, na zona oeste paulistana, no último dia 28 de novembro.
Na versão do sargento, NegoVila o agrediu e diversas pessoas o cercaram e bateram em sua cabeça. Ele afirma que atirou no artista para “repelir a agressão” e disse para Polícia Civil que não sabia se atirou para cima ou para baixo e também não sabia quantos tiros deu.
Já Wenny foi morto dentro de casa, na frente de dois adolescentes de 13 anos e duas crianças de 5 e 3, após ter a residência invadida por policiais militares, no dia 25 de novembro. O caso gerou revolta nos moradores, que organizaram protestos na região nos dias seguintes.
A versão policial, dada pelo sargento Bruno Honorato Antonio, que não participou da ação, diz que os policiais militares estavam perseguindo um carro roubado com uma única pessoa dentro. Na comunidade, o suspeito saiu do veículo e correu pelas vielas da favela. Ainda segundo o PM, após a perseguição a pé, os policiais se aproximaram do jovem, perceberam que ele estava armado e, então, dispararam contra ele.
Mais de duas semanas depois, os moradores ainda apontam no chão de uma das vielas da comunidade as marcas de repressão policial: “Aqui são as duas bombas que eles tacaram, e o gás entrou tudo para dentro de casa”, lembra uma moradora, que saiu desesperada de casa com os quatro membros da família, incluindo uma criança, para fugir do cheiro do gás em manifestação do dia 30 de novembro.
A menos de um metro da marca da bomba atirada pela polícia, o rosto de uma mulher negra foi pintado pela artista Wanatta Rodrigues, de 27 anos, que veio de Belo Horizonte somente para este ato dos artistas na capital paulista. “Aqui aconteceu a violência policial, e nós sabemos que não é um caso isolado, mas o lugar fica marcado com a história desses corpos que estão sendo executados. Então a arte vem para ressignificar o espaço, e ao mesmo tempo protesta, porque colocar um rosto negro, feminino, na cor roxa, que é lembrando [a orixá] Nanã, na entrada da favela, é um protesto importante”, conta.
Essa arte de Wanatta foi a primeira do dia, e marcou o nascimento do Projeto Ser Humano, que é uma parceria da Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio com grafiteiros. “A gente acredita que há uma Nego em toda vila, rua, regiões… E a gente acredita que a arte vai ressignificar os espaços. NegoVila foi o motivo para iniciar esse movimento artístico, e o Wenny foi o estopim para movimentar esta comunidade e a arte atingir pessoas”, explica Márcia Lysllane, de 28 anos, integrante da Rede.
E logo nas primeiras horas de projeto, um dos objetivos já foi atingido. Além dos moradores empolgados em ter as paredes com intervenções artísticas, a moradora da comunidade Rafhaela Giovana, de 18 anos, apresentou alguns desenhos que havia feito em papeis e, pela primeira vez, pegou um spray de tinta para levar a arte para as paredes. “É uma oportunidade única, já que eu nunca tinha feito a arte para atingir outras pessoas desse jeito que fiz agora”.
A assistente administrativa Liege Pereira, de 47 anos, recebeu um grafite no muro de sua casa e afirma que gostou do resultado. Segundo ela, “para a favela, que geralmente só tem cores neutras e escuras, essas artes trazem um novo olhar, mais colorido e, principalmente, mostra a necessidade de nos manifestar de alguma forma”.
O recém-criado Projeto Ser Humano pretende seguir atuando na comunidade para ocupar o máximo de espaços em muros e paredes da região pelo menos até a próxima terça-feira (15/12).
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