Defensores e familiares do militante consideram desproporcional manutenção da prisão: eles só conseguiram vê-lo nessa segunda
atualizado 13/04/2021 9:06
O militante do Partido dos Trabalhadores (PT) Rodrigo Grassi Cademartori, conhecido como Rodrigo Pilha, foi preso em 18 de março de 2021, após estender, com mais quatro ativistas de esquerda, uma faixa com a frase “Bolsonaro genocida” na Praça dos Três Poderes, durante protesto em Brasília. Todos foram liberados no mesmo dia, porque a Polícia Federal não encontrou motivos para enquadrá-los na Lei de Segurança Nacional, o que motivou a detenção. Contudo, acusado de outros dois crimes anteriores, Pilha é o único que continua atrás das grades.
Sem ver a família ou o advogado de defesa por 25 dias, Rodrigo foi transferido ao Centro de Progressão Penitenciária (CPP), o Galpão. “Não vimos o Rodrigo desde a prisão. Não conseguimos nem mesmo uma teleconferência”, desabafou o irmão do militante, Érico Grassi, semana passada. “A família está arrasada”, completou Érico, após o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) negar autorização para ele migrar à prisão domiciliar.
A Justiça, contudo, concedeu ao detento autorização para voltar ao trabalho, retornando para dormir no cárcere todos os dias – o chamado regime semiaberto, o qual Pilha deu início nesta segunda-feira (12/4). Os parentes puderam, enfim, ter um breve encontro com o ativista. “Foram dias muito difíceis. Hoje eu o peguei [no CPP] e o levei ao trabalho”, disse Érico Grassi, à noite, ao Metrópoles. “Ficamos 25 dias sem vê-lo. Ele não recebeu nada da gente, uma roupa, um chinelo… A galera do CPP é bem humanizada, ele está bem”, garantiu, aliviado.
De acordo com a Secretaria de Administração Penitenciária do DF (Seape), os presos do CPP não ficam em celas, dormem em galpões. Embora não haja visitações, eles têm direito a trabalhar fora da cadeia e a “saidinhas” quinzenais para passar o fim de semana em casa – o que renova as esperanças dos Grassi em novos contatos diretos.
Ativismo constante e polêmico
Rodrigo “Pilha” é bastante conhecido entre os quadros da esquerda do Distrito Federal. Nascido em 12 de dezembro de 1977, na cidade de Uruguaiana (RS), ingressou na militância política no PT brasiliense quando ainda era estudante, via Movimento Estudantil. Começou três cursos na Universidade de Brasília (UnB) – pedagogia, educação física e sociologia –, mas não conclui nenhum deles. Passava boa parte do tempo dedicado a articulações da chamada Juventude do PT.
Foi assim que, em 2009, entrou com um grupo de estudantes no Senado Federal, vestindo camisas com a frase “Fora Sarney”. Na época, o ex-presidente da República e então senador José Sarney (MDB) era presidente da Casa e alvo de denúncias. Também foi figura chave em protestos contra o governo do Distrito Federal, a começar pelo “Fora Arruda”, em 2010, após o escândalo da Caixa de Pandora, quando integrantes do movimento estudantil ocuparam a sede da Câmara Legislativa (CLDF).
Nessa época, ele era assessor parlamentar da então deputada distrital Erika Kokay (PT), com quem trabalhou, na mesma função, também na Câmara dos Deputados. A parlamentar acompanha a situação do ex-funcionário e amigo de longa data, mas preferiu não comentar o caso.
Ainda no DF, Rodrigo Grassi esteve em protestos em defesa da comunidade indígena no bairro Noroeste e pela gratuidade do Passe Livre Estudantil.
Durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), participou das ações de defesa do governo petista e acompanhou as caravanas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelo Brasil, antes da prisão do líder petista em 2018. Quando Lula foi preso, passou a marcar presença em frente à sede da Polícia Federal de Curitiba (PR), onde o ex-presidente ficou encarcerado, e a participar dos atos “Lula Livre” na capital e em outras cidades.
Sua forma de militância é considerada radical, inclusive, por parte da esquerda progressista. Em abril de 2014, foi bastante criticado ao hostilizar o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-ministro Joaquim Barbosa, em bar na 406 Sul. Na época, o STF protagonizou condenações do PT no escândalo do “Mensalão”. Para petistas moderados, a ação em nada ajudava na situação política do partido. Logo depois do episódio, Pilha pediu demissão do gabinete da deputada federal Erika Kokay.
No mesmo ano, envolveu-se em confusão com o então senador Aloysio Nunes (PSDB). Rodrigo abordou o político no Congresso Nacional, pedindo uma entrevista. Ao falar sobre comissões parlamentares de Inquérito (CPIs), Pilha perguntou sobre o suposto envolvimento do parlamentar com o cartel dos trens em São Paulo. O tucano classificou a fala como uma agressão e partiu para o confronto físico contra o ativista. Pessoas que estavam próximas apartaram a dupla e Grassi acabou detido pela Polícia Legislativa.
Após a queda de Dilma, Pilha também hostilizou jornalistas como Miriam Leitão e Alexandre Garcia, durante dois episódios em 2017.
Porém, o presidente do PT-DF, Jacy Afonso, considera Pilha um “militante extraordinário” e sua prisão, uma “tentativa de intimidá-lo. Causa estranhamento a negativa da prisão domiciliar”, disse.
Na prisão por desacato e álcool ao volante
Em 18 de março, quando o grupo de ativistas deixou as dependências da Polícia Federal em Brasília, coube a Pilha explicar o protesto, como porta-voz do grupo (assista abaixo). No entanto, logo depois, ele foi detido novamente, por conta de duas condenações prévias, conforme explica o advogado Thiago Turbay, do escritório Boaventura Turbay Advogados, que assumiu a defesa do militante.
Segundo Turbay, Rodrigo Grassi foi condenado por desacato, por ter proferido uma ofensa a um policial. A segunda condenação é um delito de trânsito, por direção após ingestão de bebida alcoólica. As penas foram unificadas em computo de 2 anos e 2 meses de detenção.
“Mas, por alguma razão que não está descrita nos autos, foi fixado um regime inicial como semiaberto. São duas condenações por delitos absolutamente leves. Apesar disso, foi fixado o semiaberto, mais gravoso do que o aberto”, pontuou o defensor. “O Rodrigo está preso desde março e a defesa não teve contato com ele. É absolutamente estranho. Estão dando a ele um tratamento diferente. Não houve permissão para que o Rodrigo recebesse o kit prisional, que é pedido a todas famílias. É um kit de higiene, que pudesse se cobrir, que tivesse roupas limpas”, destacou.
De acordo com Turbay, a pedido da defesa, na sexta-feira (9/4), Pilha passou do Centro de Detenção Provisória, na Papuda, para o Centro de Progressão Penitenciária (CPP), o Galpão. Assim, desde essa segunda, pode trabalhar durante o dia e deverá dormir na prisão. O trabalho externo tem uma repercussão na pena, reduzindo o tempo de prisão. Isso vale para qualquer apenado. E até 30 de junho de 2021, pela análise da defesa, Grassi teria direito a progressão para o regime aberto.
Além disso, a defesa entrou com nova ação solicitando que sejam concedidos ao militante os mesmos benefícios orientados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a própria Vara de Execuções Penais do Distrito Federal (VEP) para que se antecipasse o prazo de progressão de pena estabelecido por um critério objetivo. “Aqueles apenados que ainda estão cumprindo pena, mas que terão até o dia 30 de junho de 2021, prazo para progressão, concedesse o benefício agora para que não haja superlotação, superexposição de apenados à situações calamitosas, em razão do coronavírus”, explicou.
Há também pedido de habeas corpus no TJDFT. Mas, segundo o advogado, o pedido liminar foi negado e não há previsão ainda para o julgamento do mérito. Segundo Turbay, durante todo trâmite do caso, apenas a desembargadora atual do processo recebeu a defesa. Os magistrados anteriores não atenderam solicitação de audiência. “A defesa quer crer que o sistema de justiça criminal do Distrito Federal esteja inserido no espectro de garantias e liberdades democráticas. Essa é a única garantia que nós queremos. Se assim for, não há razão de o Rodrigo estar preso”, concluiu.
A família não nega os crimes, mas considera a detenção e a permanência na prisão desproporcionais. “É a sensação clara de ter um ente seu, que você ama, refém do Estado”, ressaltou o irmão do militante, Érico Grassi.
Outro lado
Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape-DF), até sexta-feira (9/4), Rodrigo Grassi cumpriu pena no Bloco 5 do Centro de Detenção Provisória II (CDP II). Com capacidade para abrigar até quatro pessoas, dotada de chuveiro, vaso sanitário e camas de concreto, o espaço estava ocupado por Rodrigo e outros dois internos. Ali, ele tinha direito a banho de sol, de até duas horas por dia, todos os dias da semana.
A pasta negou ter vedado contato entre o preso, familiares e defesa. “Em relação às visitas, o reeducando tem direito a encontros virtuais com seu advogado e familiares. A visita do profissional acontece uma vez a cada sete dias e a de familiares, uma vez a cada 30 dias”, afiançou a secretaria.
Nesta segunda, em nova nota, a Seap informou que agora o militante cumpre pena no CPP, “que tem características de casa de albergado. No local não há celas. A unidade prisional é composta por três blocos. O interno se encontra recolhido com outros cerca de 300 reeduncandos que saem durante o dia para trabalhar e retornam para pernoitar na unidade”.
Conforme a pasta, “os blocos são equipados com camas tipo beliche e banheiros. O atendimento médico é oferecido por equipes multiprofissionais de saúde, presentes em todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) do sistema prisional. O estado de saúde do interno é considerado normal. Até o momento, não se envolveu em nenhum tipo de intercorrência na unidade prisional”.
O Metrópoles entrou em contato com TJDFT sobre o caso. Por nota, a Corte encaminhou os processos aos quais Rodrigo Grassi responde e que estão disponíveis para consulta pública. Confirmou também a rejeição liminar do habeas corpus e que o mérito ainda não foi julgado.
A reportagem também tentou contato com a PF e PMDF sobre a detenção do ativista, mas não obteve retorno. O espaço está aberto para eventuais manifestações.
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