A ministra Maria Elizabeth Rocha do Superior Tribunal Militar (STM) apontou “uma tentativa visível de manipulação de provas” no caso da morte do músicoEvaldo dos Santos Rosa, que estava em um carro que foi alvo de 80 tiros, e do catador de recicláveis Luciano Macedo, no Rio de Janeiro. No julgamento realizado na última quinta-feira, 23, a ministra foi a única a votar para manter presos os noves militares envolvidos nos assassinatos.
De acordo com Maria Elizabeth, no auto de prisão (APF) em flagrante os militares apresentaram fotos de veículos alvejados como se fossem os blindados que eles ocupavam no momento da morte do músico. A defesa dos militares nega enfaticamente e afirma que jamais houve manipulação.
“Tais viaturas de fato possuem marca de tiro. No entanto, tais fotografias que são parte de veículos, se percebe nitidamente que se tratam de automóveis completamente diferentes daquele que estava sendo utilizado na ação. Os militares que engendraram esse esquema ardiloso para enganar o Comando do Leste apresentaram no APF fotos de blindados que foram de fato alvejados por tiros”, afirmou.
A ministra prosseguiu. “Só que os militares não trafegavam nesses blindados. Eles trafegavam numa viatura em que não se constatou tiro algum. Os militares forjaram em três fotografias inidôneas que haviam sido alvejados durante a ação quando, na verdade, o veículo que dirigiam era outro e que a perícia não constatou nenhum disparo ou nenhum tiro”.
Na sessão de quinta, por maioria de votos, o STM decidiu libertar nove dos 12 militares que participaram da ação em 7 de abril, em Guadalupe, na Zona Norte do Rio. Todos foram soltos nesta sexta-feira, 24. Do total, 11 ministros votaram pela soltura dos militares. Maria Elizabeth votou pela manutenção da prisão e indicou a suposta manipulação de provas como “mais um motivo hábil a indicar que a soltura dos pacientes possa perturbar e impedir a produção correta de provas”.
Defesa
O advogado Paulo Henrique Pinto de Mello, que defende os nove militares, divulgou nota comentando a questão. “Ela [a ministra] falou uma grande besteira, porque as fotos que ela exibe são do evento da manhã, de uma das viaturas que os militares se utilizavam. Existe um IPM (Inquérito Policial Militar) referente ao incidente da manhã. Não houve nenhum tipo de manipulação, de tentativa, de nada disso”.
Ainda, Mello afirmou que a situação torna a ministra suspeita para julgar eventuais apelações do processo. “Ela materializa coisas que não aconteceram, não está provado que aconteceram. Não houve qualquer manipulação. Ela tentou usar este argumento para justificar uma prisão preventiva que era injustificável e o tribunal recebeu”, concluiu.
O caso
Na tarde do dia 7 de abril, um domingo, Evaldo Rosa dirigia com a família pelo bairro de Guadalupe em direção a um chá de bebê, quando o veículo, um Ford Ka branco, foi confundido pelos militares com um carro do mesmo modelo roubado por um grupo de assaltantes.
Empunhando fuzis e pistolas, a tropa abriu fogo contra o veículo em duas rajadas de tiros e atingiu Evaldo nove vezes. Luciano foi alvejado quando se aproximou do carro para ajudar no socorro ao músico.
Luciana, viúva do músico, relatou que os disparos seguiram mesmo depois das tentativas de aviso, às quais os soldados teriam reagido com deboche. “O sangue espirrou todo no meu filho. E os militares rindo, eles rindo de mim. Eu pedi gritando pra eles socorrerem, e eles não fizeram nada”, contou.
Além das mortes de Evaldo e de Luciano Macedo, Sérgio Gonçalves de Araújo, sogro do músico, foi baleado de raspão.
Inicialmente, o Comando Militar do Leste (CML) emitiu nota dizendo que a ação havia sido uma resposta a um assalto e sugeriu que os militares haviam sido alvo de uma “agressão” por parte dos ocupantes do carro. A família contestou a versão e só então o Exército recuou e mandou prender dez dos doze militares envolvidos na ação.
(Com Estadão Conteúdo)
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