02/01/22 04:30
No início de 2019, duas oficiais da PM tiveram celulares roubados durante um assalto na Avenida Francisco Bicalho, no Centro do Rio. O sistema de localização de um dos aparelhos indicou seu uso dentro de Rio das Pedras, favela da Zona Oeste dominada por uma das milícias mais antigas da cidade. O batalhão responsável pelo patrulhamento da região, o 18º BPM (Jacarepaguá), foi avisado, mas, em vez de organizar uma operação para recuperar o telefone, acionou a quadrilha da comunidade para devolvê-lo à dona.
“O batalhão mandou isso pra gente, mas, quando mandou, chamaram a gente lá pra ver (...). A gente sabe que você conhece muita gente. De repente, chega até seus ouvidos que nego tá vendendo”, disse um sargento a Douglas Rodrigues Moreira, segurança de um dos chefes do grupo paramilitar. O miliciano, então, respondeu que faria um “trabalho de inteligência”. O diálogo — interceptado pelo Ministério Público do Rio com autorização da Justiça — não mostra um caso isolado: trechos de interceptações telefônicas escancaram os laços de PMs com o bando de Rio das Pedras.
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Fora o apelo para a devolução do celular roubado, as ligações — gravadas durante a investigação que culminou na realização da Operação Intocáveis 2, em janeiro de 2020 — mostram que PMs pediam a milicianos ingressos para shows numa casa noturna da favela e também solicitavam dinheiro para uma “feijoada de confraternização no batalhão”. Além disso, os grampos revelaram que policiais faziam escolta para um dos chefes da quadrilha e sua família.
Em um diálogo interceptado no dia 8 de abril de 2019, um comerciante contou a Douglas Rodrigues Moreira — apontado pelo Ministério Público como segurança de Paulo Eduardo da Silva Azevedo, o Paulo Barraco — que um policial lotado no 18º BPM lhe pediu “uma moral todo mês”.
O miliciano respondeu que o responsável pelo pagamento de propina era seu chefe, Paulo Barraco. O comerciante, então, afirmou que os PMs haviam dito que “o tenente-coronel foi promovido a coronel e iria precisar de dinheiro para a festa”.
Num segundo contato entre os dois, dez dias depois, o comerciante insistiu: um PM havia lhe perguntado se poderia “mandar o dinheiro do dia 20”, porque seria feita “uma feijoada para o patente alta”. Moreira novamente afirmou que “o negócio do dinheiro é com o zero-um”. Ao final da investigação do caso, o miliciano e o policial que cobrava a propina — o cabo Rodrigo Vassali Dutra — foram denunciados e presos. O oficial citado na conversa não foi identificado.
Vários outros policiais militares que não chegaram a ser denunciados à Justiça tiveram conversas com a milícia interceptadas. Um deles, um sargento lotado no Batalhão de Rondas Especiais e Controle de Multidões (Recom), entrou em contato com Moreira no dia 14 de abril para pedir entradas para um show do cantor Wesley Safadão.
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As escutas também revelam que um outro chefe da milícia, o capitão reformado da PM Epaminondas de Queiroz Medeiros Júnior, era escoltado por policiais. Numa ligação, um agente contou que combinou receber R$ 2.500 mensais para fazer um turno da segurança do paramilitar.
Procurada para comentar as gravações, a PM informou que um inquérito relacionado às descobertas da Operação Intocáveis 2 foi instaurado por sua corregedoria.
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O EXTRA não conseguiu contato com as defesas dos citados. Após a publicação da reportagem, o capitão aposentado da PM Epaminondas de Queiroz Medeiros Júnior negou, em e-mail enviado ao EXTRA, que “ande ou tenha andado “escoltado por policiais’”. De acordo com o texto, “dentre os poucos funcionários de confiança que fizeram ou fazem minha assessoria pessoal, entre secretários e motoristas, todos com vínculo trabalhista formal, jamais contratei policiais militares”. No texto, Queiroz também repudia “veementemente a alcunha de ‘chefe da milícia’ com a qual a matéria me insulta”. O ex-PM foi um dos 45 denunciados na operação Intocáveis 2, em janeiro de 2020. Segundo a denúncia do MP, Queiroz “atua na liderança da organização criminosa, coordenando e mantendo controle sobre todas as empreitadas criminosas, com atuação destacada no ramo imobiliário clandestino e na vigilância das localidades de Rio das Pedras e adjacências”. O capitão reformado é réu pelo crime de organização criminosa.
https://extra.globo.com/casos-de-policia/guerra-do-rio/pedidos-de-pms-milicia-de-rio-das-pedras-vao-de-dinheiro-para-feijoada-ingressos-para-shows-revelam-escutas-telefonicas-25338634.htmlPedidos de PMs à milícia de Rio das Pedras vão de dinheiro para feijoada a ingressos para shows, revelam escutas telefônicas
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